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Notícias saber cooperar

 

Somos pioneiros até no setor de ONGs

A república brasileira ainda não tinha completado seis anos quando, em 19 de agosto de 1895, um grupo de representantes de cooperativas de 13 países — Alemanha, Argentina, Austrália, Bélgica, Dinamarca, Estados Unidos, França, Holanda, Índia, Inglaterra, Itália, Sérvia e Suíça — se reuniu em Londres para debater o futuro do cooperativismo. Naquela mesma data, nasceu a Aliança Cooperativa Internacional (ACI), uma das organizações não governamentais mais antigas do mundo e uma das maiores, se considerarmos o número de pessoas representadas: 1 bilhão de cooperados. 

De lá para cá, a ACI cresceu e hoje congrega cooperativas de 110 países-membros, incluindo o Brasil. A organização tem o nobre propósito de “unir, representar e servir as cooperativas de todo o mundo”. São quatro regionais: Europa (em Bruxelas), África (em Nairobi), América (em São José da Costa Rica) e Ásia-Pacífico (em Nova Delhi).

 “A ACI tem o objetivo de promover os valores e o modelo de negócios cooperativistas, dar assistência aos governos nacionais na formulação de leis que aprimorem e fomentem o cooperativismo, também representar as cooperativas junto às organizações internacionais de interesse, como a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a própria ONU”, explica João Marcos Martins, coordenador de Relações Internacionais do Sistema OCB.

Para facilitar seu trabalho de representação, a ACI tem escritórios dedicados a defender os interesses das cooperativas em diversos setores da economia — incluindo agricultura, crédito, consumo, pesca, saúde, habitação, seguros, indústria e serviços.

RESULTADOS CONCRETOS

Associado à ACI desde 1989, o Sistema OCB compreende, com o passar dos anos, que ter uma atuação ampla, internacionalmente falando, é fundamental para aumentar a visibilidade e a representatividade das cooperativas brasileiras. 

Hoje, a Casa do Cooperativismo é membro de 16 organizações internacionais voltadas para o cooperativismo ou que tratam dos interesses das cooperativas associadas ao sistema. A maioria delas é o que se chama organização internacional de direito privado, ou seja, não envolve governos.

 “Muitas vezes, as pessoas olham para as iniciativas internacionais e têm dificuldade de ver resultados práticos, concretos e pragmáticos. E é comum confundir o interesse pelas transferências de conhecimento num fórum internacional, através de uma ação de benchmarketing ou em uma viagem de prospecção de novos negócios, com ações de cunho pessoal. Mas, se a gente olhar para a história do Sistema OCB e para a nossa atuação na ACI, veremos muitos benefícios trazidos para o coop brasileiro”, constata o coordenador. 

João Marcos conta que foi a partir dessa integração à ACI, em uma “iniciativa visionária do único brasileiro a presidir essa organização internacional, Roberto Rodrigues, que o Brasil passou a ter acesso a uma ampla variedade de boas práticas comerciais e de governança relacionadas ao cooperativismo”. 

Ainda segundo João, se olharmos para trás, para a realidade do Sistema OCB em 1989, vemos que “éramos uma organização muito menor, que tinha apenas uma sala alugada em um prédio, em Brasília. Não tínhamos nem sede própria. Depois que começamos a nos relacionar e a fazer parceria com as cooperativas de outros países, crescemos como entidade de representação e, hoje, somos uma instituição respeitada nacional e internacionalmente”

Para deixar mais clara a importância de estarmos presentes em fóruns internacionais do coop, basta dizer que foi a partir de uma missão do Sistema OCB à Alemanha que conseguimos alavancar o cooperativismo financeiro e de infraestrutura no Brasil.  

“Na década de 1990, a DGRV, que é a organização representativa das cooperativas na Alemanha, veio para o Brasil transferir conhecimento e nos ensinar o caminho para reforçar a solidez do cooperativismo de crédito. Essa parceria influenciou a criação de secretarias regulatórias de cooperativas dentro do Banco Central, que ajudaram a alavancar o crescimento das cooperativas e viabilizaram a criação do Fundo Garantidor do Cooperativismo de Crédito (FGCoop)”, conta.

Ainda na opinião do coordenador de Relações Internacionais do Sistema OCB, o principal benefício da atuação da entidade em organismos internacionais é ter acesso a boas práticas, conhecimentos e experiências que permitiram ao Sistema OCB ajudar as cooperativas brasileiras a profissionalizarem a sua governança e sua gestão.

REPRESENTATIVIDADE

De todas as entidades setoriais que a ACI tem em sua estrutura, o Sistema OCB é uma das que atuam mais ativamente nos ramos Trabalho e Agropecuário. Essa atividade ocorre, respectivamente, na Organização Internacional das Cooperativas Agropecuárias (ICAO), e na Organização Internacional das Cooperativas de Trabalhadores da Indústria, Artesanato e Serviços — que representa todas as cooperativas dos ramos Trabalho, Educacional, Produção, Mineral e Turismo (Cicopa). 

“Além desse grande sistema chancelado pela ACI, fazemos parte da Organização Internacional das Cooperativas de Plataforma, formada recentemente, em 2019, com sede em Nova York. Essa entidade fomenta essa nova fase do cooperativismo, que se dá através das plataformas digitais”, observa João Marcos. 

E a atuação internacional do Sistema OCB não para por aí. No ano passado, nossa entidade de representação fechou parceria com uma grande rede de escolas de negócios voltada para cooperativas, que hoje tem representantes em 42 países — como as universidades como Oxford, na Inglaterra; a The New School de Nova York, e a Universidade de Bolonha, na Itália. O objetivo é, por meio da capacitação, melhorar o ambiente de negócios das cooperativas e dos cooperados. 

Em âmbito regional, na América do Sul, também fazemos parte da reunião de cooperativas especializada do Mercosul, formada em 2001 para integrar as legislações do setor e as cooperativas dos quatro países do Mercosul: Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. “Essa é uma organização internacional mista, com representantes de governos e de órgãos governamentais que regulam e fomentam as cooperativas. Não é uma organização de direito privado, puramente”, detalha João Marcos.

A Casa do Cooperativismo é um dos nove representantes do Brasil no Fórum Econômico e Social do Mercosul, órgão ligado diretamente ao secretariado do bloco econômico. Na lista, adiciona-se a participação na organização cooperativista dos países de língua portuguesa, formada em 1997, com sede em Lisboa, que reúne as entidades representativas de Portugal, Brasil, Moçambique, Angola, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe, Cabo Verde e Timor-Leste. O papel dessa entidade é fomentar a intercooperação e o desenvolvimento das cooperativas nos países lusófonos. 

Outros fóruns somam-se à lista: o Brics-Coop — reunião especializada das organizações representativas do bloco econômico que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul; e a Federação Latino-americana do Leite (Fepale), principal organização continental dos produtores de leite. “Neste caso, não é uma entidade cooperativa, mas, como no Brasil a maioria dos produtores leiteiros está organizada em cooperativas, e nós aqui representamos o cooperativismo de laticínios do Brasil, então, interagimos com a Fepale”, conta o coordenador. 

Além disso, o Sistema OCB articula com organismos internacionais de direito público — como ONU, FAO, OEA, OIT, OCDE – para a representação dos interesses das cooperativas brasileiras

PRESIDENTE REELEITO

No último dia 20 de junho, Ariel Guarco foi reeleito presidente da ACI. Seu novo mandato, de quatro anos, será marcado pela revisão da identidade do coop em todo o mundo. 

“Me sinto honrado com esta reeleição. Durante os últimos quatro anos, dei o melhor de mim para cumprir o que prometi e ofereço mais uma vez meu compromisso, minha dedicação e o meu entusiasmo para continuar em uma nova etapa onde possamos consolidar novas conquistas”, afirmou Guarco, que é cooperativista desde a juventude.

Nascido na Argentina, Ariel Guarco consolidou sua liderança no coop dentro, da Cooperativa Elétrica de Coronel Pringles. Em 2008, tornou-se a autoridade máxima da Federação das Cooperativas de Energia Elétrica e de Serviços Públicos (FEDECOBA). Em 2011, foi eleito Presidente da Confederação Cooperativa da República Argentina (COOPERAR). Hoje, representa o movimento cooperativo no Instituto Nacional de Economia Social da Argentina. Foi membro do Conselho de Cooperativas das Américas (2014-2018) e eleito Presidente da ACI em novembro de 2017. É autor de dois livros: Cooperativismo Argentino, Um Olhar Esperançoso para o Futuro (2013) e Princípios Cooperativos em Ação Abordando os Desafios da Agenda Global de Hoje (2020). 

Como bem explicou o coordenador de Relações Internacionais do Sistema OCB, João Marcos Martins, a ACI tem um papel muito importante e muito difícil ao mesmo tempo, que é representar um movimento que reúne mais de um bilhão de pessoas das mais diferentes bagagens, religiões e línguas.

“O cooperativismo é uma das poucas línguas globais que a gente tem. Tive a oportunidade de visitar cooperativas tanto no Fiji, como na Rússia, em Botsuana, e todas têm esse ponto em comum de dizer que ‘sou coop’, ‘sou cooperativa’, explica João.

Esta matéria foi escrita por Lana Cristina e está publicada na Edição 38 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação

Novas oportunidades para o mercado de peixe

O período de pandemia alterou nossa sociedade em muitos aspectos — entre eles, o perfil de consumo de alimentos da população mundial, que, diante do período pandêmico, se voltou para questões de saudabilidade, rastreabilidade e qualidade. Atentas a isso, as cooperativas da área de aquicultura estão investindo na cadeia produtiva e na prospecção de novos mercados. 

No Brasil, a tilápia é a espécie mais cultivada, por ser um peixe de água doce que se adapta muito bem em tanques. Os dados da Associação Brasileira da Piscicultura (Peixe BR), referentes a 2021, apontam que foram produzidas 534 mil toneladas, representando um aumento de 9,8% sobre o desempenho do ano anterior. A tilápia participou com 63,5% da produção nacional de peixes de cultivo. As exportações aumentaram em quase 50%, no ano passado, e em 30%, somente de janeiro a abril deste ano, na comparação com o mesmo período de 2021. Entre os países que mais consomem pescados brasileiros estão os Estados Unidos, o Japão e outras nações asiáticas.

Nos mercados interno e externo, a Cooperativa Agroindustrial Consolata (Copacol), do Paraná, é um dos grandes destaques do setor. Há 14 anos, os cooperados começaram a criar tilápia e a cooperativa passou a investir no processamento industrial. Atualmente, são cerca de 280 cooperados produzindo tilápias em 800 hectares de lâminas d´água. A média de peixes abatidos por dia chega a 170 mil, a maior produção na América Latina. Além do pescado, as duas plantas industriais da cooperativa trabalham com subprodutos como escamas, carcaça e vísceras, na produção de farinha de peixe.

 “Apoiamos os cooperados em todas as etapas da cadeia produtiva. Desde o melhoramento genético, passando pela assistência técnica e orientações sobre ração e transporte”, conta o presidente da Copacol, Valter Pitol.

Ele complementa que “a venda de tilápias juntamente com a produção do frango tem sido um diferencial, do ponto de vista de logística. Enviamos as tilápias para outros Estados no mesmo caminhão frigorífico que leva o frango. Isso nos permite reduzir o preço para o consumidor final”, pontua.

Pitol explica que o investimento em integração de culturas contribuiu para aumentar a renda dos cooperados e tem motivado uma nova geração a permanecer no campo. A cooperativa prioriza o cumprimento da legislação ambiental e está atenta aos critérios de sustentabilidade para garantir a ampliação desse mercado. 

CUIDADO COM A ÁGUA

A C.Vale Cooperativa Agroindustrial é outra coop paranaense bem-sucedida no setor da aquicultura. No ano passado, ela aumentou sua produção de tilápias em 20%. Atualmente, são 222 cooperados produzindo em 752 hectares de lâminas d´'água. 

“A demanda pela tilápia deve aumentar. O crescimento tem relação com a profissionalização da atividade, o desejo do consumidor por alimentos mais saudáveis e a capacidade da indústria em disponibilizar o produto cada vez mais fresco e em tempo recorde no ponto de venda”, avalia Paulo Roberto Poggere, gerente do Departamento de Peixes da C.Vale. 

De acordo com ele, a cooperativa incentiva os produtores a adotarem a automação no manejo alimentar e no monitoramento dos parâmetros de oxigênio e água. Com isso, é possível programar e executar a alimentação das tilápias em condições favoráveis à performance produtiva, além de reduzir os custos produtivos e a degradação da qualidade de água.

 “O auxílio da C.Vale no campo da inovação também se dá por meio de testes e análises técnico-financeiras preliminares, que comprovam os resultados de viabilidade de investimento na inovação, o que garante ao produtor retorno satisfatório na operação com o uso da tecnologia”, detalha Poggere.

A C.Vale recomenda procedimentos que visam a correção da qualidade de água e o uso racional do recurso hídrico, almejando, com o conjunto dessas ações, promover a conservação ambiental e a preservação do principal ativo ambiental para a aquicultura: a água. “Dessa maneira, promovemos a sustentabilidade da atividade, proporcionando a continuidade e o crescimento da produção”, conclui.

EM BUSCA DE NOVOS MERCADOS

No Distrito Federal, a Cooperativa Mista da Agricultura Familiar, do Meio Ambiente e da Cultura do Brasil (Coopindaia) assumiu há dois anos a gestão do principal mercado do peixe da cidade, localizado na Central de Abastecimento da capital, a Ceasa. Além de garantir o espaço de venda para os 60 cooperados, a Coopindaia investiu ainda em maquinário e câmaras frias para o armazenamento dos produtos. O próximo passo é produzir carne de peixe processada para abastecer o mercado de alimentação escolar. Luciano Andrade, presidente da Coopindaia, pondera: 

“Nossa expectativa é que a população compreenda cada vez mais a importância de se consumir produtos frescos e diretos dos produtores. Queremos contribuir para a saúde de todos e esperamos que haja mais apoio para o nosso modelo de organização produtiva”. 

Não há dúvidas de que a aquicultura oferece um oceano de possibilidades para o cooperativismo. A Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO/ONU) aposta em um crescimento do consumo de pescados e aponta números otimistas. O relatório da FAO “Estado Mundial da Pesca e Aquicultura” (SOFIA), publicado em junho de 2020, estima que a produção total de peixes deve aumentar para 204 milhões de toneladas em 2030. Isso representa um incremento de 15% em relação a 2018, com a participação da aquicultura crescendo para além dos atuais 46%. De acordo com a organização, a aquicultura tem sido o setor de produção de alimentos que se expandiu mais rapidamente em todo o mundo nos últimos 50 anos, com crescimento médio de 5,3% ao ano, desde a virada do século. 

INCENTIVO À PRODUÇÃO COOPERATIVA

As entidades de representação do cooperativismo estão atentas às oportunidades abertas para o mercado de peixe. No estado do Paraná, o Sistema Ocepar realiza ações de fomento à sustentabilidade da produção aquífera junto às cooperativas locais. Em parceria com o órgão estadual de extensão rural (IDR), será lançado o programa de capacitação e atualização continuada dos técnicos de campo, para que possam otimizar a assistência aos produtores. 

“Um dos principais desafios do setor de aquicultura é o uso racional de água. A ração e a energia elétrica também pressionam as margens e fazem com que o manejo e a gestão da produção precisem ser mais eficientes, por parte do produtor”, explica Alexandre Monteiro, analista técnico da Gerência de Desenvolvimento Técnico da Ocepar. “Tecnologia para oferecer produtos que atendam à necessidade do consumidor é essencial, uma vez que o hábito de consumo está em constante evolução”, pontua. 

Em Minas Gerais, o Sistema Ocemg colocou a responsabilidade socioambiental como um norte para os projetos desenvolvidos com as cooperativas de aquicultura. A partir de uma parceria com o Sicoob Aracoop, que financia os cooperados, a Ocemg orientou processos de regularização fundiária, implementação de estratégias de marketing e otimização do uso de insumos. 

As compras coletivas de ração, por exemplo, possibilitaram a redução no preço final do pescado e ainda contribuíram para diminuir o desperdício desse insumo que tanto pesa nas contas dos cooperados, segundo Rouzeny Zacarias, analista de Educação e Desenvolvimento Sustentável da Ocemg. “Temos hoje uma rede de colaboração que não envolve apenas as cooperativas, mas também inclui agricultores familiares da região. O trabalho em grupo não é fácil, mas é fundamental para garantir o desenvolvimento local”, destaca. 

PESCA OU AQUICULTURA?

Essa é a pergunta que não quer calar: Qual é a diferença entre esses dois tipos de atividade? São sinônimos? A pesca é definida por legislação — Lei nº 11.959, de 29 de junho de 2009 — como toda operação, ação ou ato tendente a extrair, colher, apanhar, apreender ou capturar recursos pesqueiros; a aquicultura, é definida na mesma lei como atividade de cultivo de organismos cujo ciclo de vida em condições naturais se dá total ou parcialmente em meio aquático, implicando a propriedade do estoque sob cultivo, equiparada à atividade agropecuária. Com isso, a aquicultura permite a adoção de técnicas e tecnologias que garantem qualidade, padrão e maior escala para a produção. 

O Brasil possui condições favoráveis tanto para atividade pesqueira quanto para a aquicultura. São cerca de 8.500km de costa marítima e 12% da água doce do planeta correndo em território brasileiro. Estudos de instituições como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) têm auxiliado pescadores e aquicultores a aproveitarem melhor esses recursos. 

A migração do modelo de pesca para aquicultura demanda investimentos, e uma boa opção para fazer essa virada é buscar o auxílio das cooperativas de crédito, cada vez mais atentas às potencialidades desse setor.

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6 MOTIVOS PARA INCLUIR O PESCADO NA SUA ALIMENTAÇÃO

 • Ajuda na prevenção de doenças cardiovasculares; 

• Contribui para o controle dos níveis de colesterol; 

• É rico em proteínas, vitaminas e minerais; 

• Possui alta proporção de gorduras saudáveis (gorduras insaturadas); 

• É fonte de ômega 3; 

• Auxilia na manutenção de níveis adequados de triglicerídeos.

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Esta matéria foi escrita por Juliana Nunes e está publicada na Edição 38 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação

Uma nova onda

Ganhar altura e chegar cada vez mais longe. Assim como uma onda — que vai e vem no mar, e nunca deixa de existir —, a comunicação do cooperativismo está mais forte para avançar, agora com um novo objetivo: mostrar às pessoas o que é o cooperativismo, e as vantagens do nosso jeito de ser e de fazer negócios, preocupado com a sociedade e compromissado com a transformação do mundo em um lugar melhor para todos. 

Com o mote “O coop faz muito e faz bem”, a nova campanha SomosCoop foi lançada neste mês de junho e tem o intuito de apresentar o cooperativismo e os impactos positivos que ele traz para toda a sociedade. Também quer mostrar que o coop pode ser encontrado em todas as áreas da economia e faz, com excelência, tudo o que se propõe. Mais do que isso: o coop faz muito pelo Brasil, pelas comunidades em que atua e por todos os seus cooperados. 

A campanha, novamente estrelada pelo tenista mundialmente premiado Gustavo Kuerten, será dividida em três grandes ondas, ou seja, três grandes momentos com mensagens distintas para o público, mas que compõem uma unidade entre si. A estratégia deste ano será alicerçada nos seguintes conceitos: 1. O conhecimento do cooperativismo; 2. O impacto e a relevância do coop para a sociedade; e 3. O estímulo à sociedade para consumir de cooperativas. 

EMPATIA

De acordo com a gerente de Comunicação do Sistema OCB, Samara Araujo, a primeira onda terá como objetivo explicar o cooperativismo.

No primeiro momento, vamos explicar que o cooperativismo é um jeito diferente de fazer negócio, que está presente em todos os setores da economia e que ele traz impactos positivos para toda a comunidade ”, explica. 

Segundo ela, uma pesquisa conduzida pelo Sistema OCB mostra que a divulgação do cooperativismo nacionalmente tem trazido resultados positivos a respeito do conhecimento e do reconhecimento do modelo de negócio coop. Entretanto, ainda há dificuldade no entendimento de alguns conceitos. Por isso, para a campanha deste ano, o objetivo é trabalhar com uma linguagem mais coloquial, simples e objetiva.

A gente está buscando uma simplificação do discurso. Queremos que as pessoas que nunca ouviram falar do cooperativismo entendam, de um jeito simples, o que é o cooperativismo e o que ele faz para melhorar a vida das pessoas”, afirmou Samara. 

A gestora conta que, há até pouco tempo, o cooperativismo era explicado como um modelo de negócio no qual as pessoas se juntam para obter melhores resultados. “Agora, em vez de usar ‘modelo de negócio’, falamos em ‘um jeito diferente de fazer negócio, de forma colaborativa ’”. 

A partir do fim de julho, com o lançamento do Anuário do Cooperativismo — documento que divulga os dados consolidados do setor —, tem início uma segunda onda, baseada em informações sobre a evolução e o impacto do coop brasileiro. Nesta etapa, o desafio é mostrar os números do coop, destacar como estamos presentes no dia a dia das pessoas, fazendo a diferença em suas vidas e na economia do país.

Por fim, na última fase da campanha, no último trimestre de 2022, será a hora de trabalhar o convencimento. Depois de a sociedade entender o que é o cooperativismo e reconhecer sua importância, o cidadão será incentivado a escolher, conscientemente, o consumo de produtos e serviços de cooperativas. 

A pessoa está andando no supermercado e, se ela foi impactada nas outras ondas da campanha, ela entende o que é uma cooperativa, que ela traz impactos positivos, e desenvolvimento econômico e social para todos os envolvidos. Então, durante as compras, ela vai pensar: em vez de comprar esse suco A, eu vou comprar esse suco coop. Em vez de escolher uma instituição financeira que vai remeter os lucros para acionistas fora do país, vou colocar o meu dinheiro numa instituição financeira cooperativa, porque sei que uma parte dos resultados vai voltar para mim e uma outra será reinvestida na minha comunidade”, explica Samara.  

A nova campanha SomosCoop terá inserções em TV e rádio, peças para redes sociais, além de outdoors e busdooors. O Sistema OCB também disponibilizará peças para as Unidades Estaduais, que poderão definir estratégias de mídia de acordo com as características regionais.

BENEFÍCIOS PARA TODOS

O Sistema OCB entende que, ao fazer uma campanha nacional sobre o cooperativismo, também está ajudando as cooperativas na ponta, que podem se beneficiar dessa estratégia para promover o seu próprio trabalho — somando e se aliando a esse esforço de comunicação. 

Quando a gente divulga o cooperativismo, a gente facilita o trabalho de comunicação das cooperativas. Porque grande parte das cooperativas precisa ficar se explicando. Se ela faz uma campanha para divulgar o produto ou serviço dela, metade do tempo ela gasta explicando o que é, como é o modelo de negócio dela”, explica Samara.

Carimbo SomosCoop

Com a campanha SomosCoop, o Sistema OCB desenvolveu um carimbo de livre uso pelas cooperativas. O intuito é que essa marca possa ser incluída nos produtos (na embalagem de um café, por exemplo) e nos serviços (nas carteirinhas dos planos de saúde ou nos crachás de trabalhadores terceirizados), para identificar que aquilo que o consumidor está adquirindo carrega os valores do cooperativismo. 

Centenas de cooperativas já utilizam o carimbo para diferenciar e dar crédito aos próprios produtos. É o caso da Cocamar, cooperativa agroindustrial fundada em 1963, com a união de 44 cafeicultores do interior do Paraná. 

Utilizar a marca SomosCoop é uma forma de diferenciar os produtos das cooperativas perante os consumidores, transferindo a eles o seu conceito e prestígio. Se são de cooperativas, têm origem, qualidade e são confiáveis”, afirma o presidente executivo da Cocamar Cooperativa Agroindustrial, Divanir Higino. 

Para a gerente de marketing da Frimesa, Elis D´Alessandro, o público formador de opinião costuma valorizar os produtos que seguem uma linha sustentável — e o cooperativismo pratica tudo isso desde o seu início, já que carrega essas preocupações em seu DNA. 

O carimbo SomosCoop mostra para o público que o nosso produto respeita as questões de sustentabilidade e é socialmente justo, porque as cooperativas estão à frente nesse cuidado com as pessoas, com o meio ambiente e com o desenvolvimento das comunidades. O cooperativismo tem essa cultura de pensar no todo e no resultado para todos”, avalia Elis, acrescentando que o carimbo agrega valor à marca. 

Na Frimesa, cooperativa do setor de alimentos sediada em Medianeira, no Paraná, o carimbo SomosCoop pode ser visto em todas as caixas de expedição — aquelas que chegam aos supermercados — e em produtos como o hambúrguer, o leite e o iogurte. 

Para o diretor-presidente da Cooperativa Agroindustrial Copagril, Ricardo Sílvio Chapla, o carimbo facilita a identificação dos produtos, ajuda a criar uma forte ligação cooperativista e a demostrar o orgulho de ser coop.   

Nós usamos o carimbo para que as pessoas consigam identificar nossos produtos e serviços que demonstram a importância do cooperativismo. Queremos que a pessoa saiba que, fazendo essa aquisição, ela gera um impacto positivo. Dentro da Copagril, somos mais de 5 mil associados, a maioria de pequenos produtores rurais no oeste do Paraná e no sul do Mato Grosso do Sul”, explica Chapla. 

Atualmente, o carimbo SomosCoop é usado em praticamente todas as embalagens de produtos de varejo da Copagril, como macarrão, café, arroz, feijão, amido de milho, polvilho, pepino e azeiton

Se você usa o carimbo SomosCoop em seus produtos ou comunicação, mande uma foto para gente! O e-mail é Este endereço para e-mail está protegido contra spambots. Você precisa habilitar o JavaScript para visualizá-lo.

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Resultados concretos

Desde que a campanha SomosCoop passou a ser divulgada nacionalmente, na televisão, no rádio e na internet, aumentou o conhecimento das pessoas sobre o nosso jeito de ser e de fazer negócios. Quer uma prova? 

Antes do lançamento da campanha publicitária de 2020, já com Gustavo Kuerten como embaixador do cooperativismo, o Sistema OCB realizou uma pesquisa para entender a compreensão dos brasileiros sobre o coop. No estudo, realizado em 2018, quando solicitados a “citar o nome de uma cooperativa que você conhece ou já ouviu falar”, apenas 44% dos entrevistados souberam responder. Em 2021, depois da divulgação maciça do SomosCoop, a mesma pergunta foi feita em uma nova pesquisa. Dessa vez, 70% dos entrevistados conseguiram citar o nome de uma cooperativa — um aumento considerável, de 26 pontos percentuais. 

“Nossa campanha de comunicação ajudou, mas as cooperativas também têm um trabalho fundamental de divulgação do cooperativismo. Quando, por exemplo, a Unimed escolhe colocar o carimbo SomosCoop nas carteirinhas de todos os planos de saúde, ela está divulgando o movimento e gerando valor para o coop, e também para a Unimed. É um ganha-ganha. A gente faz um trabalho grande para divulgar o coop e mostrar seus benefícios, mas, com certeza, ele só gera resultado quando o público consegue identificar as cooperativas lá na ponta.”

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Esta matéria foi escrita por Lílian Beraldo e está publicada na Edição 38 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Uma consulta sobre nossa identidade

O que faz de uma cooperativa uma cooperativa? A Aliança Cooperativa Internacional (ACI) iniciou um processo consultivo global para analisar a compreensão dos cooperados sobre a identidade do nosso movimento. Afinal, com princípios e valores bem definidos fica mais fácil se manter alinhado aos propósitos que dão vida ao nosso movimento. 

A proposta da pesquisa surgiu durante o 33º Congresso Cooperativo Mundial, realizado em novembro de 2021, em Seul, na Coreia do Sul. Em um contexto marcado pelas fortes transformações sociais provocadas pela pandemia da Covid-19, foi natural as pessoas se perguntarem como essas mudanças afetariam o coop. 

De acordo com Alexandra Wilson, presidente do Grupo Consultivo de Identidade Cooperativa da ACI, os princípios do coop possuem aspecto operacional, indicando as questões práticas de como organizar e operacionalizar uma cooperativa. Já os valores são os motivos que levam as pessoas a adotar esse modelo de negócio. 

Na opinião do presidente do Conselho de Administração da Sicredi Pioneira, Tiago Luiz Schmidt, a essência do movimento cooperativo é um grupo de pessoas que se reúne para desenvolver uma atividade econômica que tem impacto social.

Eu acredito que não existe uma cooperativa próspera numa comunidade pobre. Uma cooperativa se torna cada vez mais próspera a partir do momento em que ela também consegue promover prosperidade aos associados e comunidade em que ela atua”, explica. Para ele, manter o equilíbrio entre o econômico e o social é crucial para que uma organização demonstre estar alinhada com a identidade cooperativista.

MODELO DURADOURO

A necessidade de construção de uma identidade está no cerne da criação do movimento cooperativo. Ao se reunir para compra e venda coletiva de mercadorias na Inglaterra, em 1844, os 28 tecelões conhecidos como pioneiros de Rochdale precisaram estabelecer critérios que os diferenciavam dos outros modelos de negócios já existentes. Assim nasceu a Sociedade Equitativa dos Pioneiros de Rochdale, na tentativa de criar um negócio que respondesse às desigualdades de organizações empresariais, ao mesmo tempo em que empoderasse as pessoas. Um dos motivos do sucesso duradouro do modelo é atribuído ao estabelecimento de um estatuto social com objetivos e normas para orientar a estrutura e o funcionamento da cooperativa. Esses conceitos foram debatidos durante os congressos internacionais promovidos pela ACI em 1937 e 1966, e adotados como princípios cooperativistas desde então (?).

Em 1995, durante uma nova assembleia, a ACI formalizou a Declaração sobre a Identidade Cooperativa, que inclui os princípios cooperativos e os valores-chave nos quais as cooperativas se baseiam: autoajuda, autorresponsabilidade, democracia, igualdade, equidade e solidariedade. Foi nesse momento que um novo princípio foi adicionado para atender demandas de cooperativas em todo o mundo: o interesse pela comunidade. A presidente do Grupo Consultivo da ACI comenta que, em todas as ocasiões em que os princípios foram colocados em análise, chegou-se à conclusão de que eles se mantinham fundamentalmente sólidos. Na opinião de Alexandra, isso ocorre porque os princípios atendem necessidades humanas universais. 

A experiência e a história nos mostram que há algo duradouro no modelo de negócios cooperativista e da Identidade Cooperativa, que dura mesmo quando o mundo e as próprias cooperativas se transformam. Mesmo a inclusão do 7º Princípio não quer dizer que a preocupação com a comunidade não existia antes, ela só não havia sido expressa de forma oficial”, salienta. 

POR QUE AGORA?

Passados quase 30 anos desde a última reflexão em escala global sobre o cooperativismo, a ACI volta a propor aos cooperados uma análise profunda e ampla sobre a Declaração de Identidade Cooperativa, sob a luz dos desafios do mundo atual. O coordenador de Relações Internacionais do Sistema OCB, João Martins, lembra que o coop surge como uma forma de manter a dignidade humana, gerando prosperidade e desenvolvimento social. 

Em um momento em que a sociedade passa por grandes dificuldades novamente — pandemia, aumento da desigualdade e conflitos armados —, a ACI vem propor a identidade cooperativista como uma forma de enfrentar os grandes problemas da humanidade”, comenta. 

Alexandra Wilson revela que desde a conclusão da assembleia de 1995, já começaram a ser identificadas questões sobre as quais as cooperativas deveriam se debruçar com mais ênfase, com destaque para a preservação ambiental, as relações trabalhistas, a educação sobre cooperativismo e, mais recentemente, inclusão e diversidade. Com isso em mente, foram publicadas, em 2016, as Notas de Orientação para os Princípios Cooperativos, que apontam diretrizes e conselhos detalhados para a aplicação prática dos princípios cooperativos. Alexandra reconhece, no entanto, que a extensão do documento reduz sua aplicabilidade no dia a dia dos cooperados. 

Para Martins, o momento é de fazer com que a sociedade perceba o diferencial cooperativista e que cada cooperativa se entenda como parte dessa iniciativa de mudança de comunidades mais sustentáveis. “A partir do momento que você tem um modelo de negócios que respeita os aspectos democráticos e compartilha os resultados de forma igualitária, você passa a ter uma sociedade mais estável, pacífica e economicamente responsável”. 

PREOCUPAÇÃO URGENTE

“Cooperativas precisam fazer mais e mostrar mais o que fazem para suas comunidades, em especial na atuação diante das mudanças climáticas”. A declaração de Alexandra Wilson resume dois temas apontados como prioritários pelos cooperados que participaram do 33º Congresso Cooperativo Mundial. Mesmo que o desenvolvimento sustentável esteja presente no 7º princípio e que o 5º princípio defenda a educação para o cooperativismo, as transformações provocadas pelo desenvolvimento econômico e pelas novas formas de organização social, impuseram mais peso a essas temáticas dentro da identidade cooperativa. 

As cooperativas estão correndo o risco de serem deixadas para trás por não se preocuparem adequadamente com o que está acontecendo com o mundo ao nosso redor. Nós vivemos uma emergência climática. O meio ambiente está sendo degradado em um ritmo que ameaça a viabilidade da espécie humana. E nós que acreditamos no cooperativismo como o melhor modelo, devemos nos perguntar se estamos fazendo mais do que outras companhias e organizações não lucrativas”, declara a presidente do Grupo Consultivo da ACI.

Apesar dos esforços realizados até o momento, a compreensão do público sobre o modelo cooperativo é relativamente baixa. Nesse sentido, Alexandra acredita que a consulta pode sugerir uma ênfase mais direta à conscientização sobre o modelo cooperativo. João Martins também compartilha dessa preocupação para que o cooperativismo não seja visto como uma ideia obsoleta. 

“A ACI entende que o cooperativismo vai ser transversal às mudanças pelas quais a humanidade passa. Para acompanhar o avançar da humanidade e dos debates globais que influenciam cooperados mundo afora, a ACI propõe essa grande consulta”, esclarece. 

Alexandra reforça que, apesar de não ser possível prever o resultado desse processo consultivo, o que se analisa não é uma retirada de princípios, e sim a possibilidade de adaptação ou inclusão de novos aspectos. 

ETAPAS DA CONSULTA

Diante da árdua tarefa de desenvolver uma pesquisa em escala global, o Conselho da ACI criou o Grupo Consultivo de Identidade Cooperativa (CIAG), composto por 23 membros de todas as regiões de atuação da ACI. O grupo é responsável por planejar ações que promovam uma consulta e reflexão a respeito da identidade cooperativa. A presidente do Conselho, Alexandra Wilson, explica que o processo ainda está na fase inicial e deve demorar de dois a três anos para ser concluído.

 Nessa etapa inicial, uma pesquisa foi disponibilizada no site da ACI para recolher as impressões iniciais de cooperados a respeito do significado da identidade cooperativa. A consulta aborda temas comuns a membros da ACI de todos os 150 países onde as cooperativas estão presentes. No momento, o formulário está disponível em inglês, francês e espanhol, e está sendo traduzido para diversos idiomas. 

O Sistema OCB é a organização parceira da ACI para levar essa consulta ao conhecimento das cooperativas e dos cooperados no Brasil. Segundo o coordenador de Relações Internacionais da OCB, os documentos já foram traduzidos para o português e a entidade está em contato com as Unidades Estaduais para definir a melhor forma de divulgação e disponibilização da pesquisa.

Isso deve acontecer nos próximos meses e está previsto um anúncio sobre a consulta no Dia Internacional do Cooperativismo”, afirma João. No próximo dia 20 de junho, o Grupo Consultivo deve tratar sobre a pesquisa na Assembleia Geral da ACI em Sevilha, na Espanha. Segundo Martins, a expectativa é de que na ocasião seja definido um calendário de consultas e eventos e, a partir daí, o Sistema OCB terá instrumentos para levar as informações completas às cooperativas brasileiras.

Alexandra explica que, para além do formulário on-line, devem ser realizados webinars e outros eventos consultivos em escalas regionais e internacionais para que o debate sobre identidade cooperativa agregue o máximo de pessoas possível de forma interativa. “Temos grandes ambições. O objeto é envolver todos do mundo cooperativista que tiverem interesse, independente de atuação, cargo ou localidade. O objetivo é realizar uma consulta ampla e profunda”, define.

Após reunir todas as informações e avaliações colhidas, e tendo em mente os princípios formadores, o Grupo Consultivo apresentará um parecer com sugestões à Assembleia da ACI, que vai então decidir o que fazer com as proposições apresentadas. Caso haja um entendimento de possível mudança na Declaração sobre a Identidade Cooperativa, o conselho recomenda a questão para a Assembleia Geral, que coloca a questão em votação. 

Uma alteração na Declaração não é um processo simples, já que ela está incorporada no reconhecimento das cooperativas pela Organização Internacional do Trabalho e na legislação cooperativa em diferentes países. Diante desse cenário, Alexandra Wilson aponta uma outra possibilidade: “esse não seria um processo simples, uma mudança teria que passar por duas assembleias gerais consecutivas. Já as Notas de Orientação são mais fáceis de serem alteradas. Há possibilidade, inclusive, de criar algum documento intermediário entre a Declaração e as Notas”.

IDENTIDADE FORTALECIDA

Estimular as pessoas a pensar sobre identidade cooperativa pode, por si só, fortalecer a organização cooperativa. Essa é uma das apostas da ACI com esse movimento. O presidente da Sicredi Pioneira compartilha dessa expectativa. “O segredo para preservar a identidade está no relacionamento entre associados”, avalia Tiago Luiz Schmidt. Segundo ele, quando a cooperativa realiza movimentos que trazem cooperados para dentro da organização, a comunidade se fortalece. 

A promoção de debates e capacitações sobre assuntos de interesse dos cooperados auxilia na formação de um vínculo com a cooperativa e empodera os cooperados sobre os princípios e valores do cooperativismo. Em contrapartida, o engajamento dos associados fomenta inovações nos produtos, serviços e na atuação da própria cooperativa.

Quando isso acontece, a gente atinge o momento mágico de uma identidade cooperativa plena, que não é aquela identidade que lideranças, diretores e gestores conceituam, mas aquela que os associados efetivamente vivem no seu dia a dia. Isso é identidade cooperativa: é o cooperativismo vivido pelo próprio associado”, conclui Schmidt.

Para a presidente do Grupo Consultivo de Identidade Cooperativa da ACI o conceito “1 membro, 1 voto” é o mais duradouro dos conceitos cooperativistas. “Nenhuma outra forma de negócios adota esse modelo de gestão. Esse é o princípio que eu prevejo que nunca vai ser alterado, mas é possível ter um debate sobre como melhor expressar a gestão democrática nas cooperativas para além desse nível primário”, comenta. Na avaliação de Alexandra, esse também pode ser um bom momento para que cooperativas percebam que sua identidade deve ser encarada como uma vantagem competitiva.

Uma etapa seguinte a essa mobilização teórica em torno da identidade cooperativa, é uma movimentação prática que coloque em ação tais princípios e valores. Um exemplo histórico é o ato inovador e revolucionário dos pioneiros de Rochedale que permitiram o voto de mulheres em uma época em que isso era proibido no mundo. E agora que o 33º Congresso Cooperativo Mundial apontou como foco de preocupação questões como aquecimento global, e promoção de diversidade, equidade e inclusão, essa consulta pode estimular as cooperativas a encontrar soluções tangíveis que apenas esse modelo de negócios pode proporcionar.

Alexandra Wilson impulsiona essa provocação: “Se somos uma cooperativa e operamos dentro desses valores e princípios, não deveríamos nós dizer como precisamos agir?” O presidente da Sicredi Pioneira resgata o legado do patrono do cooperativismo brasileiro, padre Theodor Amstad, ao também propor que a reflexão venha acompanhada de ação. Tiago Schmidt usa como exemplo as ações adotadas nos processos seletivos abrangentes e inclusivos da Sicredi Pioneira, que trazem diversidade para o dia a dia dos cooperados.

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Princípios do Cooperativismo expressos na Declaração de Identidade Cooperativa da ACI de 1995, que será revista este ano:

1. Adesão livre e voluntária

As cooperativas são organizações voluntárias, abertas a todas as pessoas aptas a utilizar os seus serviços e assumir as responsabilidades como membros, sem discriminações de sexo, sociais, raciais, políticas e religiosas.

2. Gestão democrática

As cooperativas são organizações democráticas, controladas pelos seus membros, que participam ativamente na formulação das suas políticas e na tomada de decisões. Os homens e as mulheres, eleitos como representantes dos demais membros, são responsáveis perante estes. Nas cooperativas de primeiro grau os membros têm igual direito de voto (um membro, um voto); as cooperativas de grau superior são também organizadas de maneira democrática.

3. Participação econômica

Os membros contribuem equitativamente para o capital das suas cooperativas e controlam-no democraticamente. Parte desse capital é, normalmente, propriedade comum da cooperativa. Os membros recebem, habitualmente, se houver, uma remuneração limitada ao capital integralizado, como condição de sua adesão.

4. Autonomia e independência

As cooperativas são organizações autônomas, de ajuda mútua, controladas pelos seus membros. Se firmarem acordos com outras organizações, incluindo instituições públicas, ou recorrerem a capital externo, devem fazê-lo em condições que assegurem o controle democrático pelos seus membros e mantenham a autonomia da cooperativa.

5. Educação, formação e informação

As cooperativas promovem a educação e a formação dos seus membros, dos representantes eleitos e dos trabalhadores, de forma que estes possam contribuir, eficazmente, para o desenvolvimento das suas cooperativas. Informam o público em geral, particularmente os jovens e os líderes de opinião, sobre a natureza e as vantagens da cooperação.

6. Intercooperação

É a cooperação entre as cooperativas, para o fortalecimento do movimento como um todo e dos princípios cooperativistas. Isso pode ocorrer em diversos níveis: através das estruturas locais, regionais, nacionais, internacionais; entre cooperativas do mesmo sistema; com cooperativas de outros sistemas; e com cooperativas de outros ramos do cooperativismo.

7. Interesse pela comunidade

As cooperativas trabalham para o desenvolvimento sustentável das comunidades onde estão inseridas, através de políticas aprovadas pelos membros. Prezam por investimentos em projetos que sejam economicamente viáveis, ambientalmente corretos e socialmente justos.


Esta matéria foi escrita por Mariana Fabre e está publicada na Edição 38 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Líder nato e pé no chão

Ele afasta a cadeira de rodinhas para deixar à vista a foto que está no aparador, encostado na parede. Meio de lado, olha para trás e aponta para o senhor que está emoldurado no único porta-retratos à mostra. Márcio Lopes de Freitas apresenta seu pai: Rubens de Freitas. É quando tira os óculos, se acomoda confortavelmente na cadeira e apoia o cotovelo na mesa. Lá vem história! Márcio gosta de contar “causos”, e o de sua família é um deles. 

Em casa, foi onde tudo começou. Márcio é cooperativista, produtor agrícola e cafeicultor. Também é presidente do Sistema OCB desde 2001. A vocação para tocar a terra e liderar as cooperativas é herança familiar. Justamente o caminho que ele percorreu até chegar à cadeira da presidência da Casa do Cooperativismo, que ele começa a contar pela trajetória do pai.  

Mas, antes de falar de seu Rubens, é preciso falar do avô de Márcio. Foi seu Zeca quem apresentou, à família e aos colegas de lida, ainda nos anos 1940, o conceito de cooperativa e a ideia de que, quando o assunto é cooperativismo, todos ganham quando ninguém perde.

Zeca produzia leite na pequena cidade de Patrocínio Paulista (SP) e vendia o produto a dois fornecedores que transformavam a matéria-prima em queijo. Até o dia em que um deles, o italiano, tornou-se o único comprador e quis reduzir o preço do litro. 

Seu Zeca não aceitou a proposta e decidiu, ele mesmo, produzir os queijos e vendê-los em Franca, a maior cidade perto de sua fazenda. Foi aí que ouviu falar em uma “tal” cooperativa e entendeu que poderia se unir aos demais produtores locais para juntos gerenciarem os próprios negócios.

Eles convidaram um técnico da Secretaria de Agricultura de São Paulo para apresentar aos produtores como aquilo funcionava. Meu pai contava que, no meio da reunião, o italiano apareceu, querendo saber o que estava acontecendo. Foi quando meu avô disse: ‘Estamos decidindo o nosso futuro!’”, relembra. 

Coube a Rubinho, o senhor Rubens que ainda era um menino, a tarefa de distrair o estrangeiro e levá-lo ao pomar “para chupar umas laranjas”, por ordem do pai. Até que a reunião acabou e ficou decidido pelos 44 agricultores das redondezas que nasceria ali, a partir daquele dia, uma cooperativa de leite.  

Desde então, a família Freitas produz e trabalha de forma cooperativa. Rubens cresceu, virou um líder e dedicou-se a melhorar as condições das coops de leite e de café no interior do Brasil. A mãe dele, avó de Márcio, tinha “cismado” que o menino deveria ser padre, mas ele fugiu das obrigações da batina e tocava as produções com o tino e a sabedoria da experiência. “Ele falava que o único diploma que tinha na vida era o de primeira comunhão, porque era obrigado a ter”, conta Márcio, rindo. 

O negócio passou de pai para filho e, depois, para os netos. Márcio foi criado em fazenda. Cresceu produtor agrícola e cafeicultor. Também transformou seu trabalho em uma missão, para fortalecer o conceito do coop no Brasil e pelo mundo. Aos 63 anos, acredita que esse modo cooperativista de fazer negócios é o segredo de sucesso pessoal e profissional da humanidade.  

Márcio com o pai e irmãos

“O modelo salve-se quem puder, a lei de levar vantagem, não está trazendo felicidade para as pessoas. A filosofia do cooperativismo é uma luva para este momento de insatisfação. Trata-se de uma economia compartilhada, em que as pessoas tomam as decisões dos rumos de seus negócios. Elas já não querem mais ser passageiros do processo. Elas querem ser autoras”, defende.  

 LIDERANÇA RECONHECIDA

Ao lado da foto do pai, no aparador que fica na sala da presidência do Sistema OCB, Márcio exibe alguns troféus. Desde que a assumiu a gestão da Casa do Cooperativismo, tem sido condecorado e reconhecido pelo seu trabalho. Uma lista de predicados, entre os quais citam-se a capacidade de articulação e de debate. Em 2009, o cooperativista foi considerado líder no diálogo com o Congresso Nacional — missão que resultou na aprovação da modernização da Lei Brasileira de Cooperativas Financeiras e, em 2012, na criação da Lei nº 12.690, que definiu novas regras para a organização e para o funcionamento das cooperativas de trabalho.  

Em 2017, a convite das Nações Unidas, Márcio participou do Fórum Político de Alto Nível, em Nova York, e, desde então, o Sistema OCB tem sido parceiro de diversos projetos da ONU para promover os objetivos de desenvolvimento sustentável entre as cooperativas.  

Dois anos depois, foi condecorado com o prêmio Distinguished Service Award (Serviço Distinto) do Conselho Mundial das Cooperativas de Crédito (Woccu), em reconhecimento a sua liderança e por seu esforço de disseminar o segmento no Brasil e no exterior.  

Aliás, criar parcerias entre países como forma de fortalecer as cooperativas é uma das bandeiras de Márcio. Por isso, ele defendeu a união dos países do Mercosul para promover o comércio entre cooperativas de região e foi um dos fundadores, em 2001, da Reunião Especializada de Cooperativas do Mercosul (RECM).   

No comando do Sistema OCB, Márcio se pronunciou em vários idiomas e estabeleceu acordos com a Confederação Alemã de Cooperativas (DGRV) e com líderes cooperativistas de Botsuana, Argélia e Timor-Leste. 

Freitas implementou um projeto bilateral para fortalecer as cooperativas de Moçambique e, durante seu mandato, em 2010, o Sistema OCB sediou o Primeiro Encontro de Cooperativas dos Brics, estreitando relações com Rússia, Índia, China e África do Sul.  

O movimento cooperativista brasileiro está muito parrudo, muito expressivo e se posicionando internamente de maneira muito forte. Com isso, também há a tendência de internacionalização das nossas cooperativas, seja na área financeira, na área de saúde ou na área agrícola. Cada vez mais, as cooperativas vão precisar de relacionamentos globais”, defende ele, que também é vice-presidente das Américas da Organização Internacional das Cooperativas Agropecuárias (Icao). 

NOVOS DESAFIOS

Para fortalecer ainda mais a presença das cooperativas brasileiras no cenário internacional, Márcio assumiu um novo desafio: agora, é conselheiro da Aliança Cooperativa Internacional (ACI). Com sede em Bruxelas (Bélgica), este organismo internacional representa mais de 50 mil cooperativas e mais de 300 milhões de cooperados de todo o mundo.
O presidente do Sistema OCB foi indicado pela experiência e pelo perfil visionário. E por ser uma “pessoa rara”, como define o ex-presidente da ACI e atual coordenador do Centro de Agronegócio da Fundação Getúlio Vargas, Roberto Rodrigues.

O presidente do Sistema OCB foi indicado pela experiência e pelo perfil visionário. E por ser uma “pessoa rara”, como define o ex-presidente da ACI e atual coordenador do Centro de Agronegócio da Fundação Getúlio Vargas, Roberto Rodrigues. 

O cooperativismo é um movimento perfeito para a natureza humana, pois une idealismo, solidariedade, ação comunitária e coletiva, mas também construção e ação. O líder cooperativista tem que somar essas duas metades de maneira absoluta e transformá-las em filosofia de vida. Márcio faz isso na perfeição. Ele traz isso na genética”, define Rodrigues, único líder não europeu a presidir a ACI, entre os anos de 1997 e 2001. Ele também é presidente da Academia Brasileira de Ciências Agronômicas e embaixador Especial da FAO para Cooperativas.   

Caso vença a eleição da ACI, em junho, Márcio pretende intensificar a rede de negócios entre cooperativas de todo o mundo. “As cooperativas brasileiras já vendem soja, carnes, frango, por exemplo, para cooperativas internacionais, mas queremos estreitar ainda mais e melhorar a nossa relação, bem como ter mais acesso aos mercados globais do sistema financeiro. Uma coop brasileira de crédito, ao se associar a bancos internacionais, será capaz de fazer negócios internacionais com mais facilidade. Para o Brasil crescer, precisamos de investimento, e as linhas de crédito e o sistema financeiro são insumos extremamente importantes.”  

Entusiasmado com a possibilidade de fortalecer o coop internacionalmente, o presidente do Sistema OCB não quer nada menos do que a vitória na ACI. “A gente, em uma eleição, só não quer perder. Eu não gosto perder nem no par ou ímpar”, brinca.  

HOMEM DO CAMPO

Márcio fala pausadamente. Fala baixo. Coisa de gente calma. Quem o conhece diz que seu tom é sempre o mesmo. Não muda. “Esquentar a cabeça, para quê?”, questiona enquanto tenta acessar o link de mais uma reunião on-line

A calma é de quem nasceu e cresceu na roça. Márcio veio de Patrocínio Paulista (SP), em meio a gado e à plantação de café. Nos anos 1970, fundou uma cooperativa de café na terra natal.   Para Brasília, mudou-se aos 17 anos, com o pai, que, a essa altura, era presidente da Confederação Brasileira das Cooperativas de Laticínios, com sede na capital. Aqui, formou-se em administração de empresas, investiu na carreira e firmou o nome no cooperativismo. E criou seus os dois filhos, que hoje têm 39 e 33 anos, respectivamente. “Aqui é ‘bão’ demais!”, brinca, carregando no sotaque. 

Mas o afeto pela cidade onde mora não diminui o banzo das origens. “Eu adoro a fazenda. Eu sou agricultor. Sinto muita falta de estar perto da terra e das minhas criações”, comenta. 

Márcio com os Irmão Adriana, Juvenal e Eduardo

As duas fazendas dele ficam no interior de São Paulo, a quase 800km da capital, onde planta café, lavoura branca e cria alguns tipos de gado. O plano é adquirir uma propriedade por aqui, tão logo seja possível. Para matar a saudade da terrinha, nos fins de semana, Márcio entra na caminhonete e vai desbravar a área rural nas proximidades de Brasília. Olha os anúncios de venda e agenda uma visita. Em parte, uma boa desculpa para conhecer as redondezas, mas também para trocar uns dedos de prosa e tomar um café.

Márcio é amante inveterado do grão. Além de produzi-lo, consome com gosto. Quase um litro por dia. A xícara de louça ágata, decorada em arabescos pretos, é mantida sempre cheia. O utensílio foi presente de um amigo, que a trouxe do Museu do Café, de Santos. “Gosto dela”, diz. 

Recentemente, começou a fazer uma dieta e logo a nutricionista sentenciou: “Um litro de café é demais”. Ele nem questionou a proibição, mas presenteou a profissional com um quilo do café produzido na fazenda dele. “Este aqui é diferente. Pode tomar”. E ela cedeu.

Márcio concorda que café é bom, mas tem que ter “paladar” e “qualidade de origem”. Quando lhe perguntam se ele prefere a bebida mais forte ou fraca, nem titubeia: “Gosto é de muito”, responde, rindo. 

APOSTA NO FUTURO  

Crédito: Revista Globo Rural

Nas andanças pela região rural da capital do país, Márcio se depara com todo tipo de história. Lamenta ver algumas propriedades abandonadas, cenários que são só a sombra do espaço produtivo que foram em outros tempos. 

Dia desses, conheceu um senhor que, ao completar 80 anos, viu-se obrigado a vender a bela propriedade no campo porque nenhum dos filhos quer tocar os negócios. Assim, preferiu ele próprio escolher, ainda em vida, quem ficaria com a casa e com as terras cuidadas por ele com tanto capricho ao longo dos anos. Ainda que a escolha fosse por alguém fora da família, interessado em comprar a propriedade. 

Para o presidente do Sistema OCB, histórias como essa são lamentáveis. Afinal, o futuro do cooperativismo está na mão dos jovens; por isso mesmo, Márcio busca maneiras de atraí-los para o nosso movimento. Em 2019, após a realização do 14º Congresso Brasileiro do Cooperativismo (CBC), ele deu todo o apoio à criação do comitê de jovens, que têm poder de decisão e de participação efetiva no planejamento de ações. 

Márcio quer ouvir a opinião fresca e dar voz à juventude.

Eles querem participar. Quem pensa que o jovem está no celular o dia inteiro, até com certo exagero, se esquece de que ele está se comunicando, se informando, absorvendo e transformando informação internamente. Vejo que eles querem transformações, modelos de negócios diferentes, como o cooperativismo, que propõe o compartilhamento de economia e a participação nos resultados.”

Só para se ter uma ideia da promessa que representa a juventude no cenário do cooperativismo brasileiro, Márcio reforça que o grande diferencial da produção agrícola no Brasil não está relacionado a questões climáticas ou geográficas, mas o sucesso se deve ao perfil do agricultor, que tem menos idade do que no resto do mundo. Em nosso país, este profissional tem, em média, 44 anos. Na Europa, ele é 28 anos mais velho. Isso se traduz em trabalhadores mais dispostos e conectados, e desenha um nicho de mercado atraente. “A agricultura brasileira é almejada como um mercado de trabalho interessante, como bom gerador de renda.”

EMPATIA

Márcio com a esposa

As mulheres são outra aposta deste líder para o incremento do cooperativismo. Na gestão de Márcio, elas também ganharam um comitê e espaço para se posicionarem e contribuírem. A visão sustentável da economia e a habilidade de serem multitarefas são algumas das características femininas indispensáveis ao movimento.

Na lista de outros valores importantes para o cooperativismo estão a empatia, a coletividade e o apoio mútuo. As pessoas valem por serem únicas e individuais, não pelo capital financeiro que representam. Não importa o percentual, elas terão sempre o mesmo poder de decisão.

Para Roberto Rodrigues, “um movimento perfeito para a natureza humana, pois é composta por corpo e alma, matéria e espírito, assim como o cooperativismo é feito de idealismo e de construção, de sonho e de resultados”.

O sétimo princípio do cooperativismo, que prega o “interesse pela comunidade”, é uma das causas defendidas por Márcio. Pensando nisso, ele nacionalizou um importante programa de voluntariado que já mostrava sua força em Minas Gerais, onde foi criado e batizado “Dia da Cooperação” ou “Dia C”, pelo Sistema Ocemg. A proposta é estimular líderes cooperativistas a trabalharem em prol de suas comunidades — o que beneficiou, só em 2021, mais de 5 milhões de cidadãos.  É derrubar, por meio de ações, a arraigada cultura do individualismo. 

Um modelo de ganhos coletivos, baseado em trabalho e renda, visto como solução para o atual momento de crise econômica e até mesmo para o conflito pessoal que o mundo atravessa. Um movimento que reúne, atualmente, 17,2 milhões de brasileiros cooperados, e cerca de 4,8 mil cooperativas no Brasil. 

A incapacidade, do modelo social que nós temos, de gerar felicidade, está fazendo as pessoas olharem para novas alternativas. O cooperativismo acaba sendo um porto seguro, porque você trabalha a questão dos valores, os princípios de um desenvolvimento econômico, vamos dizer assim, com caráter, que ajuda a transformar a sociedade e gerar um desenvolvimento propício à justiça social e à prosperidade”, defende Márcio. “A sociedade quer, cada vez mais, um modelo diferente de qualidade de vida. As pessoas querem ‘ser’ mais do que ‘ter’ mais”, acrescenta.    


Esta matéria foi escrita por Flávia Duarte e está publicada na Edição 38 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Dia C voltou a ser presencial

Aqui no Brasil, no mesmo dia em que se comemora o Dia Internacional do Cooperativismo acontece o Dia de Cooperar, mais conhecido como Dia C, um evento em que se celebra os projetos de responsabilidade socioambiental desenvolvidos pelas cooperativas brasileiras.

Em 2022, após dois anos de pandemia, o Dia C voltou a ser realizado presencialmente, o que para nós é um motivo de enorme alegria”, festeja Débora Ingrisano, gerente de Desenvolvimento de Cooperativas do Sistema OCB. 

A gestora explica que, este ano,a Unidade Nacional ajudou as coops e as Unidades Estaduais a mobilizarem suas bases, fornecendo enxoval de comunicação para os interessados, além de apoio institucional. 

“Nosso papel, no Sistema OCB, foi disseminar a importância de aproveitar esta data para apresentar à sociedade um pouco do que o coop faz, diariamente, para melhorar a vida das pessoas e preservar o meio ambiente. Mas, são elas quem decidiram o que fazer para comemorar essa data. A gente não conduziu o processo”, esclarece.

Até o fechamento desta edição da Saber Cooperar, mais de 10 Unidades Estaduais já tinham confirmado participação no Dia C. E, vale destacar: com a volta das atividades presenciais existe uma oportunidade de aumentar ainda mais o engajamento e a mobilização das cooperativas para ações e projetos transformadores nas comunidades. 

A ideia foi estarmos mais próximos, estimulando as cooperativas para a construção, retomada ou continuidade de projetos sociais relacionados aos diferentes Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) ”, explica Guilherme Costa, coordenador de Desenvolvimento Humano e Social, do Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo (Sescoop) Nacional.

O QUE VEM POR AÍ

Após dois anos de comemorações à distância, as coops brasileiras conseguiram levar para perto das comunidades atividades como o projeto de reciclagem da Unimed Inconfidentes, de Ouro Preto (MG). Os cooperados dessa unidade organizaram uma feira de produtos reciclados, que inclui sabão produzido a partir de óleo de cozinha usado, vassouras de garrafas pet e nécessaires, sacolas e bolsas criadas a partir de banners que deixaram de ser utilizados.  

O mais bacana é que, além de estar ajudando a cuidar do futuro do planeta, o projeto também beneficia organizações filantrópicas mineiras. Segundo Juliana Vieira, coordenadora de Comunicação e Marketing da Unimed Inconfidentes, a cooperativa colabora com a arrecadação de matéria-prima para o Núcleo de Apoio aos Toxicômanos e Alcoólatras (Nata) — grupo de apoio a dependentes. Os integrantes produzem o sabão a partir do óleo de cozinha e as vassouras de garrafas pet.  Além disso, existe uma parceria com a Associação de Catadores Padre Faria, que reutilizam os banners não mais usados pelas cooperativas para a produção de itens como nécessaires, sacolas, bolsas de supermercado e aparadores de panela. 

Juliana conta que a sustentabilidade sempre teve vez, na Unimed Inconfidentes. “Evitamos o uso de copos descartáveis ofertando xícaras aos colaboradores e também trabalhamos com economia de papel e luz”. No entanto, a coordenadora reforça que o projeto de reciclagem surgiu da curiosidade de conhecer o destino dos itens descartados na cooperativa. 

Por mais que a gente fizesse um trabalho com coleta seletiva, sempre tivemos curiosidade de saber qual era o destino dado para esses materiais. No caso dos banners, vimos uma bolsa [produzida a partir deles] em uma atividade da Ocemg [Organização das Cooperativas do Estado de Minas Gerais] e firmamos a parceria. No caso do Nata, ficamos sabendo que eles precisavam de garrafas pets por uma colaboradora e passamos a ajudar”, explica.

De acordo com Juliana, todos os colaboradores da cooperativa foram envolvidos nos preparativos para a feira de reciclados no Dia C. “Para arrecadar garrafas pet e óleo usado de cozinha fizemos uma gincana, entre os colaboradores, e o prêmio foi uma nécessaire feita de banner e restos de tecido”, conta. 

RECUPERAÇÃO DE NASCENTE

Na Sicoob Credip de Espigão D’Oeste, em Rondônia, o projeto para o Dia C também envolveu sustentabilidade. Em parceria com a Secretaria de Meio Ambiente da cidade, os colaboradores deram o pontapé inicial no trabalho de recuperação de uma nascente do Rio Palmeiras, no bairro Bela Vista. O projeto de limpeza da área e construção de uma estrutura para proteção da nascente, com assentamento de pedras, começou no Dia C. 

Na entrada do bairro existe uma reserva que é da prefeitura, mas está bem degradada, com uma nascente morrendo, sem muito fluxo de água”, explica Ronaldo Magalhães da Costa, gerente do posto da cooperativa de crédito rural em Espigão D’Oeste. 

A cooperativa abraçou a proposta da prefeitura de recuperar a área e buscou doações de mudas de árvores nativas, como açaí, palmeiras e ingá, junto ao Instituto de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater), de Rondônia. Também foram firmadas parcerias com empresas para a doação de material de construção e adubo. 

“Como é um projeto totalmente voluntário, as ações serão feitas nos finais de semana. Nossos voluntários são os colaboradores da Sicoob Credip [19 pessoas], mais sete pessoas da Secretaria de Meio Ambiente”, explica Ronaldo da Costa. 

Segundo Dener Freitas dos Santos, colaborador da cooperativa que também participa do projeto, a estrutura da área de preservação indica que deveria haver uma lagoa na região, mas não é visível por conta da degradação da nascente. “Como a nascente está fraca, muita gente no bairro nem sabia da existência dessa lagoa”, observa. Com a recuperação, a ideia é que, no futuro, seja criada uma área de lazer para o bairro Bela Vista, com quadras de areia e pergolado, atendendo a aproximadamente 400 pessoas. 

COLETA SOLIDÁRIA

A cooperativa de geração de energia Certaja, de Taquari, Rio Grande do Sul, decidiu trazer para o Dia C um projeto que executa desde 2018. “A gente tem uma parceria com a prefeitura para promover um dia de recolhimento de vidro e lixo eletrônico. Fazemos isso trimestralmente e, dentro da cooperativa, a gente estimula o pessoal a fazer o descarte”, conta o engenheiro Ambiental e de Segurança da Certaja, Leandro da Cruz Vargas. 

Em 2022, a cooperativa agendou uma campanha para o período de 1º a 8 de julho, como forma de celebrar o Dia C. Na parceria com a prefeitura, a gestão municipal usa sua capilaridade para divulgar a campanha e a cooperativa trabalha na captação de patrocínios. 

A prefeitura se utiliza de todos os meios eletrônicos para fazer a divulgação, a logística e o acesso às escolas e comunidades. Nós, da parte ambiental da Certaja, entramos com os patrocínios para conseguir coletores e bags”, explica Vargas. 

Para o engenheiro ambiental, as ações sustentáveis se tornaram uma realidade no dia a dia das empresas.

As empresas hoje estão mais engajadas nessa questão do meio ambiente, de promover hábitos ou ações relacionadas a isso. Sabemos que tanto a decomposição do resíduo eletrônico, como a do vidro levam anos. A Certaja quer conscientizar as pessoas no descarte adequado desses produtos. Somos uma cooperativa que atua na área socioambiental nas 20 comunidades onde estamos, então achamos interessante fazer esse trabalho”, diz. 

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ENTENDA O DIA C

O Dia de Cooperar (Dia C) nasceu em 2009, no Sistema Ocemg. O objetivo era desenvolver ações de responsabilidade social, colocando em prática os valores e princípios cooperativistas, por meio do voluntariado. Rapidamente, a ideia ganhou a simpatia de diversas cooperativas mineiras que passaram a apoiar e desenvolver, anualmente, as ações do Dia C. 

Após o sucesso alcançado em Minas Gerais, o Sistema OCB decidiu expandir o evento para o restante do país. E, em 2013, realizamos um projeto piloto em sete Estados e, no ano seguinte, o Dia C passou a ser realizado simultaneamente em todo o país.

É fundamental esclarecer que as ações apresentadas no Dia C são uma pequena amostra dos projetos sociais desenvolvidos, de forma permanente e contínua, pelas cooperativas brasileiras para apoiar o desenvolvimento das comunidades onde atuam (7º princípio do cooperativismo) e contribuir com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU.

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REDE SOLIDÁRIA

Desde que passou a ser um evento nacional, em 2013, o Dia C já realizou mais de

14 mil iniciativas

de voluntários, que beneficiaram 

24,8 MILHÕES 

de pessoas 


Esta matéria foi escrita por Mariana Branco e está publicada na Edição 38 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Um século de reverência ao coop

Todo ano, o primeiro sábado de julho deixa o mundo um pouco mais cooperativo. Neste 2022, em centenas de países, as cooperativas comemoraram o centésimo Dia Internacional do Cooperativismo (#CoopsDay) — uma iniciativa da Aliança Cooperativa Internacional (ACI), que visa chamar a atenção da sociedade para o nosso jeito diferente de ser e de fazer negócios, promovendo a solidariedade, a eficiência econômica, a igualdade e a paz mundial. 

A comemoração foi dupla, pois, além de um século do CoopsDay, também se completa uma década em que a Organização das Nações Unidas (ONU) homenageou o nosso modelo de negócios, declarando 2012 como o Ano Internacional das Cooperativas. Na ocasião, o slogan escolhido para as comemorações foi “Cooperativas constroem um mundo melhor”, agora eleito o tema do Dia Internacional do Cooperativismo 2022. 

“Este ano vamos viver o nosso Dia de uma forma muito especial. É a edição centenária desta celebração e isso nos enche de orgulho e responsabilidade. Devemos mostrar ao mundo que nossa doutrina está mais viva do que nunca e que é fundamental para a construção de um mundo melhor. É justamente para isso que o slogan deste ano se orienta. As Nações Unidas deixaram bem claro que esse modelo econômico e social ajuda a construir um mundo onde ninguém fica de fora e onde ninguém é deixado para trás”, declarou o presidente da ACI, Ariel Guarco.

Ariel Guarco, presidente da ACI

Em comunicado enviado às entidades de representação do coop ao redor do mundo, a ACI pediu que todas as cooperativas aproveitassem o dia 2 de julho para mostrar ao mundo que têm orgulho de ser coop. O texto dizia o seguinte:

Vamos contar ao mundo que nós colocamos as pessoas em primeiro lugar, que somos éticos, justos e ótimos para fazer negócios. Reverberar que fazemos parte de um movimento global com mais de um bilhão de membros, que representam 12% da população mundial empregada.” 

Agora que você conhece um pouco mais da história do #CoopDay,  conta para gente: como você comemorou essa data? 

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VOCÊ SABIA?

As cooperativas foram homenageadas em 2012 pela Organização das Nações Unidas (ONU) por terem sido responsáveis pela criação de 100 milhões de vagas de emprego em todo o mundo, logo após a crise financeira global de 2008. 

Estudos realizados na época mostraram que as cooperativas ajudaram na recuperação econômica das cidades onde estavam localizadas, além de contribuir ativamente com o cumprimento dos chamados Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, que vigoraram até 2015. Após o envolvimento de Governos, sociedade civil, academia e vários outros agentes, a partir de 2016, esses desafios foram revistos e transformados nos 17 atuais Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).  

Outra curiosidade, é que desde 1995, a ACI e as Nações Unidas — por meio do Comitê para a Promoção e Avanço das Cooperativas (COPAC) —  definem conjuntamente o tema para a celebração do #CoopsDay.

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Esta matéria foi escrita por Mariana Branco e está publicada na Edição 38 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Caminho para um mundo melhor

Em tempos de crise, as cooperativas confirmam sua vocação para construir um mundo melhor. Mais do que um modelo de negócios, somos um jeito diferente de gerar emprego, renda e novas oportunidade para quem coopera. 

As coops têm ajudado a promover o desenvolvimento sustentável das comunidades onde atuam, sem  deixar ninguém para trás. Esse, aliás, é um dos principais objetivos da Agenda 2030 da ONU – um plano global composto de 17 objetivos ambiciosos e interconectados, que buscam erradicar a pobreza e promover vida digna a todos, dentro das condições que o nosso planeta oferece e sem comprometer a qualidade de vida das próximas gerações.

São vários os atributos que fazem do cooperativismo um exemplo de construção de um mundo melhor para todos:  desde o jeito de trabalhar aos serviços oferecidos até o foco no cliente sem deixar de lado o próprio cooperado. 

Para conversar sobre os diferenciais do cooperativismo e sobre o que ele tem oferecer para o mundo, a revista Saber Cooperar entrevistou o embaixador do Cooperativismo pela Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), Roberto Rodrigues, e a assessora responsável pela implementação de estratégia de cooperação descentralizada do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) no Brasil, Ieva Lazareviciute.  

Saber Cooperar — Aproveitando o gancho do Dia Internacional do Cooperativismo 2022, como as cooperativas ajudam a construir um mundo melhor?

Roberto Rodrigues -  O cooperativismo é uma doutrina conhecida no mundo todo e, sem dúvida, é a doutrina que mais agrega pessoas no mundo inteiro. Nenhum partido político, nenhuma religião, nenhuma instituição, tem tamanha participação na atividade global do que o cooperativismo. E como é uma doutrina com princípios iguais em qualquer país do mundo, independente do regime de governo ou de opção religiosa, então ela tem realmente a condição de fazer o mundo melhor. Com uma das suas características principais: o cooperativismo é inclusivo. Ele inclui pessoas que estão fora do processo de desenvolvimento do mercado por condições econômicas, sociais ou políticas diferenciadas. Ora, pessoas excluídas, desesperadas, destroem a democracia, destroem a paz porque levam à revolução, ao descontentamento. Então, por ser um movimento inclusivo, o cooperativismo passa a ser um dos mais importantes fatores de defesa da paz social e da democracia. E hoje o que existe no mundo é uma certa erosão do processo democrático. É preciso resgatar isso e as cooperativas têm, pelo seu caráter inclusivo, uma condição notável para defender a democracia e a paz. 

Ieva Lazareviciute – Sem dúvida as cooperativas representam um mecanismo de atividade produtiva intimamente ligada aos conceitos da agenda 2030. Aos conceitos de um desenvolvimento mais holístico e um desenvolvimento que não deixa ninguém para trás. Digo isso porque as cooperativas, pela sua natureza, para palavra “cooperar”, já revelam uma construção conjunta. Uma construção conjunta no caso de bens econômicos que beneficiam todos os seus integrantes de uma forma mais direta. Esse é um aspecto. No segundo aspecto está o fato de as cooperativas estarem localizadas, muitas vezes, nos locais que estão mais distantes das grandes cidades, das grandes empresas. Estão nas áreas rurais ou olhando para uma parcela da sociedade que muitas vezes não possuem acesso aos serviços de grande porte, aos serviços mais complexos. Então, neste sentido, as cooperativas estão contribuindo para não deixar ninguém para trás, que o coração principal da agenda 2030. Dessa forma, as cooperativas, pelo seu jeito de trabalhar, e pela forma, pelo local, pelo tipo de serviço oferecido, pelo foco no cliente que está mais distante, elas representam exatamente um exemplo da construção de um mundo melhor para todos. 

Dentro do cooperativismo, fala-se muito que o coop é o modelo de negócios do futuro. Você concorda com essa avaliação? Por quê?

RR - O cooperativismo é o modelo de negócios do presente, pois inclui pessoas, reduz a concentração da renda, além de oferecer oportunidades e alternativas para os pequenos. Ele foi inovador no passado, é no presente e será no futuro novamente. A doutrina permite ao cooperativismo trazer para o mercado negócios inclusivos que melhoram as condições democráticas de participação de todos. Portanto já é um negócio importante e tende a ser cada vez mais um jeito diferente de fazer negócios, mais justo e mais ético, sobretudo em um mundo que sofre com a erosão do processo democrático. 

IL – Sim, eu concordo fortemente e acho que cada vez mais percebemos algumas tendências no mercado que reforçam a importância e a relevância do cooperativismo. Primeiro: a questão de princípios. A forma como as empresas atuam. Como o setor produtivo atua. Os valores que eles seguem, os princípios que embasam as atividades produtivas e que acabam virando fatores importantes além do lucro financeiro na avaliação dos investimentos, dos trabalhadores, dos clientes, de toda a cadeia. Com tendência de que aqueles que são mais sustentáveis, mais alinhados com princípios inovadores, princípios do futuro, acabam recebendo mais atenção de investidores e clientes que estão mais preocupados com as questões de sustentabilidade. E cada vez mais pessoas estão preocupadas com isso. 

Em segundo lugar, eu acho que também tem o fator da localização geográfica. Tem o aspecto de proximidade com as pessoas. Ter uma cooperativa na sua comunidade significa que, de um lado, tem um serviço de fácil acesso, e do outro mantemos os recursos na região, criando um movimento virtuoso de desenvolvimento regional. Neste sentido, acredito que as cooperativas fazem parte do modelo de negócios do futuro. 

Que paralelo podemos traçar entre os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU e o modelo de negócios cooperativista?

RR - Os ODS têm uma claríssima ligação doutrinária com o movimento cooperativista. Grande parte dos conceitos das ODS são parte integrante do DNA das cooperativas. Erradicação da pobreza, o cooperativismo trabalha intensamente a favor da erradicação da pobreza. Ou seja, está totalmente integrado. O segundo ODS, acabar com a fome, isso é o DNA do cooperativismo. Da mesma forma que o cooperativismo quer acabar com a pobreza, ele quer acabar com a fome, que é o maior flagelo universal e precisa ser eliminado. Então estamos integradíssimos. O terceiro ODS trata da defesa da saúde e do bem-estar, outro pilar de atuação das nossas cooperativas. Educação de qualidade também é um princípio do cooperativismo, assim como a igualdade de gênero. Há também nos ODS o fomento à energia limpa e acessível. As cooperativas fazem isso a todo tempo, em especial as cooperativas agropecuárias, que estão trabalhando a todo vigor com energia solar, eólica e biocombustíveis. O Brasil tem hoje 48% da sua matriz energética com energia renovável, enquanto a do mundo gira em torno dos 15%. Já o oitavo ODS fala em trabalho decente e crescimento econômico. O que propõem as cooperativas de trabalho? Exatamente o trabalho decente, de forma que haja um equilíbrio entre o trabalho e a qualidade de vida dos trabalhadores e das cooperativas. Resumindo, as cooperativas trabalham, hoje, com toda a Agenda dos ODS.

IL: Como falei anteriormente, o cooperativismo pensado bem, localizado bem, com produtos de qualidade, produzidos com tecnologia sustentáveis, inovadoras, trabalha para reduzir a pobreza por manter os recursos no local de produção, contribuem com a agricultura sustentável, que é uma ODS. Com segurança alimentar, as cooperativas podem contribuir com saúde, que é a ODS 3, podem contribuir com a educação, que é a ODS 4. Enfim, a gente pode listar todas as ODS. Podemos avaliar e identificar links muito diretos entre o modelo das cooperativas e as ODS. Claro que o escopo desse impacto positivo depende muito de como o negócio cooperativista é conduzido porque não basta ser só cooperativa para garantir que as tecnologias utilizadas sejam ambientalmente sustentáveis, ou que o produto será adaptado. De maneira em geral, o modelo cooperativista se aproxima do modelo de colaboração, cocriação, que é necessário para implementar a agenda 2030. 

 Na sua opinião, qual seria a receita para um mundo melhor?

RR - Essa pergunta é muito complexa. Eu diria que tem alguns valores essenciais na vida. Eu, durante um longo período da minha juventude, até da minha idade madura, tive muita dúvida sobre o sentido da vida. Claro que essa resposta nunca foi encontrada, nenhum grande filosofo encontrou. Na fé encontramos sentido para tudo, mas não havia uma resposta do ponto de vista social, econômico, político. Então deixei de olhar e buscar o sentido da vida e passei a ver as coisas com um viés contrário: diante do fato de que a vida é uma dádiva divina, que nos foi concedida por nossos pais, e que é tão espetacular que ao invés de procurar o sentido da vida decidir dar um sentido para a vida para justificar a dádiva que recebemos. E a resposta é simples: ajudando a fazer um mundo melhor. E como eu posso ajudar a fazer um mundo melhor, sendo apenas um agrônomo? Estudei um pouco mais e cheguei à conclusão que se todo mundo ensinasse o que sabe para todo mundo haveria um equilíbrio e o mundo passaria a ser melhor. Então ensinar passou a ser o meu objetivo. Então eu fui dar aula na universidade e com isso esperava estar dando um sentido para a minha vida. Isso fechou o clico virtuoso da minha vida: estamos aqui para aprender e, aprendendo, devemos ensinar a todos para que todos tenham a mesma informação. Ensinar a todos contribui para um mundo melhor. E fazer o mundo melhor é o meu sentido da vida. E esse é o caminho que tenho seguido até hoje, dando aulas nas universidades. 

Por outro lado, também me preocupei em buscar a felicidade. Qual seria o caminho da felicidade? Quais instrumentos deve-se buscar para ser feliz. Estudei muito e a conclusão que cheguei é que a felicidade é o canto de um pássaro que não se pode aprisionar. Mas que precisamos buscar ouvir o tempo inteiro. E depois de estudar muito, identifiquei que há dois caminhos pelo qual se pode chegar à felicidade. Um deles é o amor, e o outro é a justiça. E ambos no sentido mais geral possível. Praticar o amor e praticar a justiça. Cheguei a seguinte frase: a felicidade é uma viagem. Não é uma estação. É uma viagem dentro de um trem que anda sobre dois trilhos: do amor e da justiça. E o combustível do trem é a esperança de fazer um mundo melhor. A receita para um mundo melhor é procurar a felicidade coletiva. Na viagem da vida, sobre os trilhos do amor e da justiça, com a expectativa de fazer um mundo melhor. 

IL – não existe uma única receita para todo mundo. Cada país é diferente, cada cidade é diferente, cada empresa é diferente. Então a receita tem que ser customizada de forma mais adequada a cada situação para acelerar o desenvolvimento. Mas eu acho que existem alguns ingredientes em comum para o mundo inteiro como empatia, capacidade de analisar e aplicar as oportunidades de colaboração, respeito pelas diferenças, e o compromisso com uma mudança, com um mundo melhor, são absolutamente importantes. E, por fim, ousadia. Ousadia para inovar, testar soluções. Errar e procurar novos caminhos para chegar a soluções de funcionam e que mudem o jeito de atuar. 


Presença necessária

Para a deputada federal Aline Sleutjes (PR), o número de mulheres no cooperativismo demonstra que elas estão conquistando seu espaço, mas ainda há mais para ser alcançado.

Precisamos criar meios de apoiar e incentivar mulheres para novas missões nas cooperativas e na política”, declarou.

Por ser de uma família e de uma cidade com forte vocação cooperativista e agropecuária, a deputada entende que o protagonismo feminino tem muito a contribuir para o mundo do cooperativismo e do campo.  

Precisamos refletir sobre o espaço das mulheres em todos os níveis hierárquicos no ambiente de trabalho, que deve ser o mais amplo possível em prol não apenas do desenvolvimento coletivo, mas também da equidade social. As mulheres têm conquistado espaços de destaque em diversos setores da sociedade e no agronegócio não é diferente. Um trabalho que sempre foi considerado bruto, pode sim ter a força e o olhar feminino”.

Natural de Castro, cidade do interior do Paraná considerada a capital do leite, Aline foi vereadora por dois mandatos e se tornou a primeira mulher a representar o município na Câmara dos Deputados. Já em seu primeiro mandato, foi a primeira mulher a assumir a presidência da Comissão da Agricultura da Câmara dos Deputados — um desafio e tanto, pois ela assumiu o cargo em plena pandemia. 

No primeiro ano da crise sanitária, a maior parte das atividades parlamentares foi interrompida e as votações estavam restritas ao plenário. As demandas de 2020 foram acumuladas para o ano seguinte, mas sob a presidência da deputada, a comissão tirou muitos projetos da fila. “Tive que acelerar e com o apoio e respeito dos meus colegas, conseguimos votar 160 projetos e realizar mais de 90 audiências públicas”, relata.

A deputada também é titular da Secretaria da Mulher da Câmara e desabafa: ser mulher na política sempre é um desafio, em razão da cobrança que sofre para conciliar o trabalho de fora com a vida doméstica, os estudos, a vida social e o cuidado da família. 

Cuidar da casa e dos filhos ainda é visto muitas vezes como uma obrigação feminina e que os homens não precisam se preocupar. Mas temos conquistado nossos espaços não só na política, mas nas demais funções, provando nossa capacidade, desenvoltura e comprometimento”, comenta Aline.


Esta matéria foi escrita por Débora Brito e está publicada na Edição 37 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Sempre em busca de novos desafios

Quando se fala do impacto do protagonismo feminino, os bons exemplos vêm de diferentes gerações de mulheres. Jovens ou mais maduras, iniciantes ou não no cooperativismo, elas não desperdiçam a oportunidade de inovar e romper barreiras.

Mineira de Belo Horizonte, Júnia Bueno Neves, de 58 anos, construiu uma carreira sólida e respeitada como engenheira civil. Trabalhou na Prefeitura de BH por 42 anos e ocupou diferentes cargos, incluindo de gestão, no sistema Confea-Crea (Conselhos Federal e Regional de Engenharia e Agronomia), depois de eleita por seus pares.

Mas Junia nunca se aquietou. Há pouco mais de cinco anos, ela decidiu ingressar no cooperativismo e já vem colhendo frutos de um trabalho diferenciado no mercado de engenharia. Filha de uma grande cooperativista, José Neves, fundador da Unimed BH, ela também se tornou uma fundadora e criou, em 2017, a Cooperativa de Trabalho de Engenharia e Agronomia (Engecoop).

O objetivo era reunir profissionais engenheiros e agrônomos de diferentes especialidades, como civil, mecânica, química, arquitetura, geociências, ambiental, saúde, indústria, entre outras, para prestar serviços técnicos de planejamento, consultoria, elaboração de projetos, estudo de viabilidade econômica, perícia, vistoria, laudos, direção de obras e outros. A cooperativa atende a projetos da iniciativa privada e do setor público e também oferece cursos de capacitação.

Oferecemos uma gama muito grande de serviços. Hoje tem cerca de 100 cooperados que atendem no Brasil inteiro. Mas com a pandemia, tivemos um processo difícil na engenharia em 2020 e 2021. Agora é que a gente está fazendo essa reversão, porque algumas coisas estão sendo modificadas e impulsionadas no mercado de trabalho da engenharia”’, conta.

Como mulher, não é difícil imaginar os desafios enfrentados por Júnia na área da engenharia. Ela se formou no final da década de 1970, quando os cursos da área de exatas eram majoritariamente masculinos. Felizmente, ela não se intimidou e hoje, aos 68 anos, sente-se mais preparada para contornar e confrontar as situações de preconceito. 

Alavancar uma cooperativa que ainda não é tão conhecida na sociedade nem no meio cooperativista não é fácil. É preciso ter uma postura de se impor e entrar nas interlocuções com o masculino sabendo que toda vez é um desafio”, disse.

Junia também preside a Associação de Engenheiros e Arquitetos da Prefeitura de BH e é diretora administrativa da Mútua, o braço assistencial do Confea-Crea. A engenheira ainda integra um grupo de mulheres cooperativistas do Sistema Ocemg, que busca capacitar as cooperadas e aumentar a participação feminina nas cooperativas, principalmente nas instâncias de poder e gestão. 

Começamos a ter as primeiras reuniões para discutir essa questão da mulher no cooperativismo, independente do ramo. O foco é a mulher, não importa se ela é de uma cooperativa de saúde, de trabalho, de crédito. Vamos fortalecendo e criando alternativas para termos representação dentro do sistema, tanto nas regionais, quanto em nível nacional” sugere.

Junia defende que as mulheres precisam ser reconhecidas por seu profissionalismo, ocupando todos os espaços que puder. “A mulher pode estar onde ela quiser, fazer o que ela quiser. Então, é a oportunidade que a gente tem para dizer que se coloque, se apresente. O caminho não é fácil, mas o movimento de ocupação precisa vir da gente”.


Esta matéria foi escrita por Débora Brito e está publicada na Edição 37 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Fazendo acontecer

Do início como estagiária em uma cooperativa de crédito no interior do Paraná até a coordenação de uma área estratégica no Sistema OCB, foram mais de 20 anos de uma trajetória de lutas e determinação. Débora Ingrisano ingressou no mundo do cooperativismo ainda muito jovem, quando cursava Administração, e não desperdiçou as oportunidades que surgiram pelo caminho.

Ela começou em uma agência que atende cooperados e passou por diferentes funções, como caixa e o atendimento de clientes, até que o presidente da cooperativa na época notou sua habilidade de comunicação e a convidou para estruturar a área de marketing. Mesmo sendo ainda uma estudante, aceitou o desafio. 

Débora Ingrisano

Comecei a cuidar da área e adorei. Eu me identifiquei demais com comunicação e marketing nessa cooperativa singular. Depois, apareceu uma oportunidade de ir para Brasília, trabalhar na Confederação, daí eu cuidei de um projeto de padronização e ampliação da marca Sicoob”, conta. 

Mais adiante, depois de morar um tempo fora do país com a família, Débora voltou para a área de marketing da cooperativa, quando foi convidada para trabalhar em uma área comercial, de apoio aos negócios. E a guinada mais recente na carreira ocorreu em novembro de 2021, quando foi convidada para ingressar no sistema OCB, como Gerente de Desenvolvimento de Cooperativas.

Esse convite me atraiu muito, porque é um sonho pra todo mundo trabalhar no Sistema OCB, por ser a maior organização do cooperativismo. E também por trabalhar com educação, que é algo que eu gosto muito. Essa é minha história”, resume.

Sobre os desafios enquanto mulher, Débora compartilha que mudou sua percepção à medida que a temática ganhou mais abertura na sociedade. Ao longo de sua carreira, ela reagiu de maneira diversa à medida que foi amadurecendo sobre o assunto.

“Quando eu era mais jovem, eu ensinava as meninas que trabalhavam comigo a não se importar, dar uma risadinha se ouvisse alguma piadinha. Hoje, quando eu lembro, eu até já pedi desculpa para essas mulheres. Eu não tinha noção de que estava errado e que é preciso se posicionar para evitar a normalização do assédio”, relembra.

Outro aprendizado importante na carreira de Débora veio depois da leitura do livro “Faça Acontecer'', de Sheryl Sandberg. A autora fala que homens são promovidos por potencial e mulheres por entregas. “De fato, sempre tive que entregar, entregar, entregar. Cheguei a liderar equipes sem cargo de gestão, para depois receber parabéns. E vi homens chegando com menos experiência do que eu, com quase nenhuma entrega, subindo na carreira com argumentos como: “olha, ele tem muito potencial, tem três pós-graduações", mas e as entregas?”, questiona.

No cargo atual, em um ambiente majoritariamente feminino, Débora sente-se mais encorajada a incentivar outras mulheres a mostrarem seu potencial e avançarem na carreira cooperativista, principalmente no contexto de valorização de uma maior diversidade nas empresas.

O cooperativismo é um movimento socioeconômico. E a parte social, eu acredito que as mulheres fazem com mais destreza porque o feminino é acolhedor, é humano. O protagonismo feminino é essencial para que o cooperativismo tenha futuro. Hoje, temos uma grande quantidade de mulheres no mercado de trabalho, com capacidade de consumo e alto grau de instrução.  Se a gente quer construir o futuro, não pode dispensar as mulheres por razões econômicas, educativas e sociais”, argumenta.

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Esta matéria foi escrita por Débora Brito e está publicada na Edição 37 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Semeando Futuros

"Falar de protagonismo feminino é falar de empoderamento feminino. As mulheres investem em seu próprio empoderamento quando dedicam tempo para estudar e para investir em sua qualificação”, ressalta Divani Matos, coordenadora do projeto Semeando Futuros, desenvolvido pelo Sistema OCB em parceria com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) para formar e capacitar lideranças femininas para o Agro, especialmente no âmbito da agricultura familiar.

Ao participar de capacitações como essa, Diva, como é conhecida, tem a oportunidade de compartilhar um pouco de sua própria vivência. Nascida em Januária, norte de Minas Gerais, assim  como muitas meninas do interior, ela teve de lutar muito para estudar.

Aos 18 anos, Diva ouvi seu pai dizer que — para uma mulher — bastava concluir o Ensino Médio.

Divani Matos, coordenadora do projeto Semeando Futuros

Eu tive de sair da minha cidade, que não tinha faculdade na época, para estudar. Meu pai, no começo, não aceitava essa ideia. E minha mãe não sabia como me apoiar”, relata.

Ela conta que discordou, esperneou, chorou e com muita garra, perseverança e, claro, muito estudo, conseguiu ser aprovada no vestibular de Pedagogia na Universidade Federal de Viçosa (UFV), distante cerca de 800 km de sua cidade natal e localizada na zona da mata mineira. “Morei em Viçosa, em alojamento e enfrentei, com essa escolha, uma evidente decepção do meu pai”.

Na Universidade, Diva se engajou no movimento estudantil e despertou uma curiosidade acadêmica pelo tema do protagonismo feminino, inspirada nas próprias barreiras, antes consideradas por ela mesma como intransponíveis. O tema das mulheres continuou em seus estudos no Mestrado em Extensão Rural (UFV). Mas sua trajetória no cooperativismo e associativismo, em especial com lideranças femininas, não ficou só na teoria. Ainda recém-formada, ela passou a trabalhar com associação de mulheres extrativistas cuja principal bandeira era o empoderamento feminino. 

Diva trabalhou por vários anos como consultora do tema em organismos de cooperação internacional, como a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e o Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA). Também passou por diferentes cooperativas e trabalha no Sistema OCB desde abril de 2013.

Não importa onde atuo, sempre procurei direcionar o meu olhar para as particularidades e os desafios das mulheres. Ao estimular o protagonismo feminino não estamos querendo o lugar dos homens, queremos a igualdade, a equidade, o respeito. Assegurar espaços para a liderança feminina nas organizações não é uma questão de ser ‘politicamente correto’ e está intrinsecamente ligado ao desempenho das organizações como um todo , incluindo a economia, como diversos estudos comprovam. Inovação é outro tema que surge quando falamos em tendências de futuros, no plural, mesmo. E como inovar contando sempre com as sugestões de um mesmo perfil de liderança?” questiona.


Esta matéria foi escrita por Débora Brito e está publicada na Edição 37 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Somando forças

Não é novidade que a colaboração e o trabalho em equipe fazem um time mais forte para vencer desafios. Foi essa lógica da união de esforços e de estratégias para vencer objetivos em comum que deu origem ao CoopMode — projeto de intercooperação que envolve cinco cooperativas do estado do Paraná que decidiram, juntas, desenvolver um ecossistema cooperativista de inovação. 

O projeto foi criado em janeiro de 2021, inicialmente, com a participação das cooperativas agroindustriais Frísia, Castrolanda e Capal, que já mantêm uma parceria institucional intercooperativa representada pela marca Unium

Por estarem sempre trabalhando juntas, as três coops perceberam que estavam enfrentando desafios muito parecidos para implementar a cultura da inovação em suas equipes. Por isso, decidiram montar um projeto conjunto de fomento à inovação. E, como a diversidade de olhares é fundamental para quem deseja criar algo novo, elas decidiram convidar uma quarta cooperativa para incrementar a parceria: a Capal Cooperativa Agroindustrial.

Percebemos que, por meio do CoopMode, poderíamos atender demandas estratégicas das cooperativas participantes e também trabalhar em conjunto e agregar cada vez mais valor aos negócios da região”, destaca Fábio Solano, analista de Estratégia e Inovação da Frísia Cooperativa Agroindustrial.

O gerente de Estratégia, Projetos e Processos da Castrolanda Cooperativa Agroindustrial, Vitor de Almeida Fonseca, concorda e acrescenta: “Considerando as incertezas do mercado e os desafios envolvidos em cada ideia inovadora, é confortante saber que não estamos sozinhos. Juntos, conseguimos refletir melhor sobre situações novas, e o compartilhamento de experiências tem sido ótimo para tomarmos decisões mais assertivas”.

PILARES DE ATUAÇÃO

O CoopMode é baseado em três pilares. O primeiro é a cultura da inovação, que busca sensibilizar — por meio de palestras e capacitações — colaboradores, cooperados e a alta gestão das cooperativas sobre a importância de investir em novas ideias, processos, produtos e serviços, valorizando a diversidade de olhares, pensamentos e perfis.  

Os outros dois pilares da iniciativa são a realização de projetos conjuntos e a conexão com ecossistemas de inovação, com a promoção de editais de inovação e de ações de inovação aberta — aquelas realizadas em parceria com outras instituições.

Por decisões estratégicas, a implementação dos pilares do CoopMode vai acontecer aos poucos e o primeiro deles, que trata de cultura de inovação, já está em andamento. “Decidimos trabalhar, inicialmente, com a sensibilização da alta liderança, justamente para muni-los de dados sobre o ecossistema de inovação e de cases práticos de uso de novas tecnologias no agronegócio. Cada evento de sensibilização tem contado com uma média de 100 participantes, focando sobre tendências e novidades em todo o setor”, conta Fábio Solano.

Segundo Alessandra Heuer, responsável pela Comunicação e Marketing da Capal, os eventos de sensibilização de lideranças já começaram a trazer resultados positivos para sua cooperativa. 

Hoje, já vemos a cultura da inovação presente no dia a dia da Capal; estamos pensando de forma mais inovadora, buscando parcerias e ferramentas que vão nos ajudar nos resultados. Estamos pensando, também, que a inovação é agora, é hoje, e não algo distante”, observa Alessandra. 

QUANTO MAIS COOPS INOVANDO, MELHOR

No início deste ano, mais uma cooperativa agroindustrial paranaense, a Agrária, foi convidada a fazer parte do CoopMode. 

“Em 2021, tivemos um benchmarking com a Castrolanda na área de Estratégia e Projetos, que abriu portas para a troca de experiências na área da inovação”, conta Danielle Machado, responsável pela área de Estratégia Corporativa da Agrária. “Recebemos o convite das cooperativas do Grupo Unium e encaramos como uma oportunidade para compartilhar experiências em inovação, tecnologia e ASG (sigla para ambiental, social e governança), discutindo e explorando oportunidades para crescimento dos cooperados e das cooperativas”, completa.

Segundo Danielle, o trabalho em intercooperação tem sido excelente para promover a busca por objetivos em comum. “A difusão do modo de ser cooperativista é aplicada na utilização das melhores práticas de cada cooperativa, com vistas à potencialização dos resultados. Dessa forma, nos apoiamos em nos mantermos atualizados sobre as novidades relevantes para o setor. Isso fortalece cada uma das cooperativas frente ao mercado”, observa.

Danielle destaca, ainda, que a parceria já está dando frutos. “Nosso grupo trabalha focado em resultados. Elaboramos uma matriz de priorização dos assuntos de interesse em comum para as cooperativas e definimos um calendário de estudos dos temas mais relevantes. No mês de abril, tivemos a primeira palestra do ano com um especialista externo, que explorou as possibilidades de projetos de Energia Limpa”, conta.

Além das quatro cooperativas, o CoopMode conta com o apoio da Fundação ABC — instituição sem fins lucrativos que realiza pesquisa aplicada para desenvolver e adaptar novas tecnologias, com o objetivo de promover soluções tecnológicas para o agronegócio aos mais de 5 mil produtores rurais filiados às cooperativas Frísia, Castrolanda e Capal, além de agricultores contribuintes.

Para Luís Henrique Penckowski, gerente técnico de Pesquisa da Fundação ABC, a união de pessoas, trabalhando juntas para um mesmo objetivo, acelera a busca pela solução de um problema. “Nos mais de 95 anos de cooperativismo nos Campos Gerais, nós temos vários exemplos de que isso dá certo. É por isso que a Fundação ABC apoia o CoopMode para buscar soluções inovadoras aos produtores cooperados”, afirma.

ECOSSISTEMA DA INOVAÇÃO

Para 2022, além da continuidade das atividades de capacitação e sensibilização, que serão estendidas a um público mais amplo das quatro cooperativas, as ações do projeto deverão ser ampliadas. 

Estamos agora entrando em uma nova etapa, que se refere às práticas de gestão de projetos específicos compartilhados nas cooperativas. O foco é entrar com esses projetos práticos com o objetivo de melhorar processos e produtos que as cooperativas trabalham”, explica Fábio Solano. “Essa nova fase poderá gerar resultados com alto grau de escalabilidade, uma vez que os projetos são voltados ao core business de todos os membros envolvidos”, completa.

Também está em estudo para este ano a abertura de editais de inovação em conjunto, com temáticas específicas e compartilhadas com os negócios das cooperativas. “Além disso, estamos debatendo a viabilidade de realizar programas de residência com foco em inovação”, conta o analista de Estratégia e Inovação da Frísia.

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A união faz a força

Criada em 2017, a Unium (fusão das palavras “união” e “um”) é uma das mais bem sucedidas iniciativas de intercooperação do país, envolvendo três das principais cooperativas agropecuárias do Brasil: Castrolanda, Frísia e Capal. 

Antes de intercooperarem, essas coops atuavam de maneira independente nos mercados de leite e derivados lácteos, produção e comercialização de carne de suínos, e produção de trigo. Separadas, tinham recursos limitados para investir em pesquisa e em novas tecnologias e gastavam muito com marketing, logística e despesas administrativas. Foi então que decidiram unir forças para tornar o cooperativismo mais forte na região e criaram uma marca conjunta, a Unium.

Desde então,      passaram a dividir despesas e a unir suas produções. Resultado? Em 2021, sob a marca Unium, faturaram R$ 4 bilhões, consolidando-se como a segunda maior produtora de leite do Brasil. Além disso, exportam carne, rações e grãos para mais de 25 países. Para saber mais, acesse o case completo da Unium no site do InovaCoop

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Entenda o poder da intercooperação

Sexto princípio do cooperativismo, a intercooperação é uma maneira inteligente e eficaz de fortalecer o nosso movimento. Afinal, quando uma coop cresce, todo o cooperativismo cresce junto, ganhando maior visibilidade na sociedade.

Ainda segundo a Aliança Cooperativa Internacional (ACI), a intercooperação tem natureza voluntária e consensual, não podendo ser imposta, necessitando do apoio e da contribuição de todas as partes envolvidas. Essas parcerias podem acontecer de diversas maneiras e com diferentes graus de comprometimento entre as partes. Confira: 

  • Intecooperação local, nacional, regional e internacional: é a classificação mais básica e analisa o âmbito geográfico da parceria. Os acordos locais são válidos no município das cooperativas envolvidas; os regionais são mais amplos, abrangendo uma região, com um ou mais estados; a intercooperação nacional é válida em todo o Brasil e a internacional ultrapassa nossas fronteiras. 
  • Intercooperação setorial e intersetorial: a intercooperação setorial é realizada entre cooperativas, centrais ou sistemas de um mesmo ramo; a intercooperação intersetorial é a realizada entre cooperativas, centrais ou sistemas de dois ou mais ramos diversos.
  • Intercooperação formal e informal: essa classificação envolve o formato legal da parceria. A intercooperação formal conta com estruturas ou contratos formais estabelecidos para esse fim; a informal tem, normalmente, mais flexibilidade e menores custos, mas acarreta maior insegurança, o que poderá causar problemas de governabilidade. 

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Esta matéria foi escrita por Alessandro Mendes e está publicada na Edição 37 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Começar de novo

Existem histórias de superação que merecem ser contadas. E essa fala sobre mulheres que, por influência dos companheiros ou por necessidade, terminaram parando na cadeia. E foi lá, em um momento difícil e com poucas esperanças, que elas descobriram que podiam mudar de vida. Tudo isso, graças à primeira cooperativa social formada por presos do Brasil: a Cooperativa Social de Trabalho Arte Feminina Empreendedora (Coostafe), que nasceu da necessidade de criar um instrumento de reinserção social para as detentas e ex-detentas do Centro de Reeducação Feminino de Ananindeua, no Pará. 

Essa coop inspiradora começou a funcionar em 2013, com 15 detentas que produziam pequenos artesanatos e bordados. Atualmente, são 25, entre mulheres e LGBTQIA+, custodiadas no Centro de Reeducação Feminino de Ananindeua. Uma informação importante: das quase 300 cooperadas que já passaram pelo projeto, nenhuma voltou a ser presa. 

A cooperativa tem um grau de importância muito alto em nossas vidas, pois é por meio do trabalho exercido que conseguimos nos libertar das amarras do passado, conseguimos aprender novos ofícios, ser      pessoas melhores no conjunto em que vivemos e para onde iremos”, declarou Aretha Corrêa, custodiada integrante da Coostafe.

Assim como todas as colegas cooperadas, Aretha participa constantemente de programas de capacitação,  palestras e oficinas sobre produção de artesanato e gestão do negócio.

Somos bem-aventuradas em ter o apoio do Estado, por meio da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seap), e também do Sistema OCB, que nos traz constantemente cursos de cooperativismo e educação financeira. Ter esse suporte nos ajuda a qualificar nosso trabalho e é de extrema importância’’, acrescenta Aretha.

Recém-chegada à Coostafe, Débora Bianca trabalha com tintas e pincéis. “Um pote de ouro”, diz. “A cada quadro pintado, imagino o semblante do cliente. É uma satisfação grande ver meus quadros serem vendidos”, confessa. 

De origem indígena, Débora levou muito de sua cultura para o trabalho. Com dois filhos, sonha ter o próprio ateliê. “A cada trabalho, busco fazer o melhor. Minha alegria é ver a felicidade dos clientes”, afirma.

As peças produzidas pelas cooperadas da Coostafe são comercializadas pelo Instagram (@coostafe.pa) ou em feiras de artesanato promovidas por parceiros, como a Assembleia Legislativa do Estado do Pará, o Tribunal de Justiça do Estado do Pará, a Secretaria de Estado de Administração Penitenciária, a Secretaria de Estado de Cultura e uma rede de shoppings local. 

POTENCIAL PARA VENCER 

Reprodução | Facebook

As muitas histórias de superação vividas na Coostafe não poderiam ser contadas sem a participação mais que especial de Carmen Botelho, ex-diretora do Centro de Reeducação Feminino de Ananindeua. Carmem chegou à unidade em 12 de junho de 2013 e percebeu que as detentas não tinham a oportunidade de trabalhar ou estudar. 

Quando cheguei, conheci muitas mulheres fortes e criativas, mas que não tinham oportunidade. Foi quando tive a ideia de pedir para quem sabia pintar, bordar ou costurar dar aulas para outras mulheres. Elas toparam. Então, comprei o material, selecionamos as participantes e iniciou-se o curso”, recorda Carmen, que atuou no sistema carcerário do Pará por quase 15 anos.  

Com o material produzido, foi organizada uma feira dentro do presídio e todo o material foi vendido. O dinheiro arrecadado foi repassado integralmente para as participantes, que ficaram felizes e pediram para repetirmos a experiência. 

“Fui conversar com o meu superintendente da época e chegaram à conclusão de que não poderíamos fazer as vendas. Então, tive que encontrar outro meio para viabilizar a venda dos produtos feitos por elas. E foi assim que conheci o modelo cooperativo”, afirma.

Carmem entrou em contato com o Sistema OCB e explicou sua ideia de abrir uma cooperativa dentro de uma penitenciária. “Eles apoiaram a iniciativa e me ajudaram e criar a Coostafe, primeira cooperativa de mulheres presas do Brasil”, diz, orgulhosa.

Morando em Fortaleza, já aposentada, Carmem sente falta do contato com a cooperativa e suas cooperadas. “Sinto muita falta delas. Sempre acreditei no potencial das meninas e, da minha parte, só fiz o investimento inicial. O resto foi com elas, que são as protagonistas de suas estórias — mulheres fortes, empreendedoras, criativas. Eu não fiz nada, só minha obrigação enquanto diretora de uma unidade prisional, que é procurar meios para fazer os presos não reincidirem no crime”, avalia Carmem, que ficou no CRF de 2013 a 2018.


Esta matéria foi escrita por Freddy Charlson e está publicada na Edição 37 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Tânia, a mulher que faz

Ela está ajudando a mudar a imagem da Casa do Cooperativismo desde 2008, quando assumiu uma vaga de assessora na instituição. Pioneira, arrojada e inovadora, Tânia Zanella foi a primeira mulher a assumir a superintendência da Unidade Nacional do Sistema OCB. Antes disso, foi a primeira pessoa a assumir a Gerência-Geral da OCB — cargo que ajudou a criar e implementar, após ter sido a primeira mulher a assumir a Gerência de Relações Institucionais da instituição. Por essas e outras, Tânia foi eleita, em 2021, uma das 100 mulheres mais poderosas do agronegócio brasileiro pela revista Forbes.

Tânia Zanella

A história da nossa superintendente começou no interior de Santa Catarina, na pequena cidade de Ipumirim. Em um tempo em que a tecnologia não mantinha as crianças somente em casa, ela gostava de subir em árvores, brincar de pique-esconde, pique-pega, bola de gude, queimada e de atirar com estilingue. 

A gente vivia em um ambiente, eu acho, muito mais seguro do que vivemos agora”, compara. Líder desde sempre, era ela quem decidia as brincadeiras, que só acabavam quando a mãe, de dentro de casa, chamava alto as crianças — sujas de tanto brincar — para entrar.

Tânia é de uma família italiana. Os bisavós chegaram ao Brasil vindos de Gênova, cidade portuária da Itália, fugindo da guerra, da fome e da miséria. Os antepassados entraram no país por São Paulo e foram se espalhando pelo Sudeste, até o Sul. Os avós se estabeleceram em Santa Catarina e tiveram 12 filhos, sendo o mais novo o pai de Tânia. Além de agricultores — ofício que se perpetuou pelas gerações seguintes —, a avó de Tânia era professora de latim —      profissão em voga na época. “Meus avós falavam praticamente cem por cento dialeto [variedade linguística regional da Itália]. Quando eu fui começar a fazer um curso de italiano [língua padrão do país todo], vi que era muito diferente”, recorda-se.

O pai de Tânia, Valdir Zanella, iniciou na carreira política muito cedo, aos 18 anos de idade. Chegou a ser prefeito do município, Ipumirim, por cinco mandatos. Enquanto ela seguiu os passos do pai em relação ao direito e à vocação política, o irmão mais velho seguiu a veia agrônoma da família, e hoje é quem dá continuidade aos negócios. Tânia fez todo o ensino fundamental em escolas públicas da cidade, formação à qual é muito grata. Aos 15 anos, decidiu mudar-se para Curitiba para continuar os estudos, pois, na cidade grande, teria condições melhores de alcançar os objetivos profissionais. 

Eu tive que viver muito cedo longe dos meus pais. Foi uma experiência muito bacana, mas que me fez amadurecer muito cedo”, conclui     . 

Quase 30 anos mais tarde, quando levou seu atual marido, Raul Monteiro, para conhecer a família, ele ficou impressionado com a influência dos pais e dos avós na formação da amada.

Ela já estava com os meninos na casa dos pais [os dois filhos, Luiz Felipe e Isabel, do casamento anterior de Tânia], e eu fui conhecer a cidade de origem dela. E me impressionou muito a qualidade da cidade, que vinha do compromisso do pai da Tânia com a comunidade, pois ele teve cinco mandatos como prefeito. Essa parte da ligação da Tânia com a política, a capacidade de realizar coisas, a seriedade e o compromisso, ela puxou do pai. E da mãe, ela herdou a força, a energia. A mãe dela, em casa, não para, está sempre fazendo tudo. É uma família bem tradicional italiana, laços de família muito fortes. Então, me surpreendeu ver como essa origem tem a ver com as características dela hoje”, avalia o marido.

Entretanto, de todas as heranças que Tânia recebeu da família, a maior é, sem dúvida, afetiva: “Como eu tive um contato muito grande com meus avós, porque eles moravam com a gente, nossa casa estava sempre muito cheia. Foi isso o que me marcou: a casa cheia. Uma família de 12 irmãos, muitas visitas, a casa cheia de tios e primos. Essa coisa da família, de estar sempre ali, discutindo tudo, decidindo tudo em conjunto; aquela gritaria, que você não sabe se está falando ou brigando”, diverte-se a caçula, que acredita ter herdado também o hábito de elevar o tom de voz quando está entusiasmada. 

AMOR ANTIGO

Tania em família: com os pais e os filhos

A paixão pelo cooperativismo é outra herança que Tânia recebeu da família. “Meu contato com o cooperativismo começou na infância, porque Santa Catarina é um estado extremamente cooperativista. Meus pais eram cooperados; então, eu já tinha esse contato e esse convívio ali”, explica.

Outra paixão antiga foram os esportes. Alta e esguia, Tânia era ponteira de um time de handebol, e das boas. Tanto que jogou profissionalmente, disputou o campeonato nacional pela Seleção Brasileira Juvenil e continuou praticando o esporte até o início da faculdade de direito, que cursou na Universidade do Vale do Itajaí (Univali).

Logo que se formou, Tânia prestou exame para a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e passou de primeira. Em seguida, começou a cursar a Escola Superior do Ministério Público, já com o objetivo de fazer carreira na instituição, na qual fizera estágio. Ela chegou a prestar concurso e trabalhou no Ministério por um período, mas, por questões financeiras, resolveu voltar para casa para montar o próprio escritório.

De volta a Ipumirim, ela mal teve tempo de desfazer as malas. Poucos dias depois, recebeu uma proposta que mudaria sua vida: Odacir Zonta, que já foi vice-prefeito e prefeito de Ipumirim, e deputado estadual por Santa Catarina por dois mandatos, deixaria a Secretaria de Agricultura do estado para se candidatar a deputado federal, e convidou Tânia para assumir a assessoria jurídica do gabinete. 

Ele ganhou as eleições e, em princípio, não ia trazer ninguém para Brasília, mas, como eu tinha feito um bom trabalho com a administração da campanha, ele me convidou pro gabinete. Eu aprendi muito com o deputado, iniciei toda a minha carreira com ele e estou em Brasília por causa dele”, reconhece Tânia.

Foi na capital do país que Tânia conheceu o primeiro marido, com quem teve os dois filhos, Felipe e Isabel. “Passei um susto muito grande com meu primeiro filho. Ele teve um problema muito sério de saúde quando nasceu; então, foi talvez meu primeiro grande desafio na vida. O interessante era que não dependia de mim: dependia dele. Eu — que sempre fui muito afoita pras coisas, muito dinâmica em querer fazer e acontecer —tive de exercitar minha paciência: o tempo era dele, não meu. Hoje ele é um menino extremamente saudável e inteligente”, diz, grata. 

Voltando à trajetória profissional, Tânia trabalhou com Zonta por todo o primeiro mandato federal, de 2003 a 2006, e até a metade do segundo, quando ele foi reeleito. Em 2008, o então superintendente do Sistema OCB, Ramon Belisário, a convidou para integrar a equipe de assessoria parlamentar da organização. Fabíola Nader Mota, atualmente gerente-geral do Sistema, lembra-se da chegada dela na empresa e de como se tornaram amigas e parceiras profissionais. 

“Eu era estagiária na época e ela foi contratada como assessora parlamentar para apoiar nossos trabalhos de relacionamento com os Três Poderes. Ela já tinha uma convivência bem legal com a equipe do Sistema, porque trabalhava para o deputado Zonta, que era o presidente da Frente Parlamentar do Cooperativismo. A gente já dialogava muito com ela, para nos apoiar nos temas que estavam tramitando e diziam respeito ao cooperativismo. Ela era o nosso apoio lá no Congresso e, como já conhecia muito sobre o coop, foi convidada para trabalhar aqui, ajudando a profissionalizar ainda mais o nosso trabalho de relações governamentais, que hoje já foi ampliado para Relações institucionais”, recorda-se. 

MENTORA

A capacidade de sonhar e realizar foi a grande característica que a trouxe para o Sistema OCB e marcou sua trajetória na organização. Quando Ramon a convidou, o projeto deles era justamente estruturar a Gerência de Relações Institucionais da organização. Infelizmente, Ramon faleceu em abril daquele ano, devido a um acidente de carro, apenas um mês depois da chegada de Tânia. Foi um grande baque para a recém-chegada, que, no entanto, não esmoreceu e levou a cabo a missão, com toda a equipe.

Tânia foi a minha mentora durante toda a minha carreira, sempre me apoiando, me dando oportunidades, me ensinando, apoiando ideias malucas e propondo ideias, também, sempre inovadoras, ousadas. A gente sempre teve um trabalho muito forte de parceria, uma relação de muito respeito que cresceu, também, para ser, inclusive uma, uma amizade”, reconhece, com alegria, Fabíola.

Na mesma época, Tânia engravidou da segunda filha, Isabela. Quando voltou da licença-maternidade, o presidente do Sistema OCB, Márcio Lopes de Freitas, a convidou para assumir a Gerência de Relações Institucionais, cargo que ela ocupou de 2008 a 2012. 

Esse foi apenas o pontapé para novos desafios e estruturações na casa. Já havia no planejamento estratégico da instituição a previsão de contratação de um gerente-geral — cargo que, até então, não tinha saído do papel. Mais uma vez pioneira, Tânia foi a primeira pessoa a assumir o cargo, em 2012, e lá ficou até o ano passado, quando assumiu a superintendência da casa.

Foi uma escolha natural”, disse Márcio Lopes de Freitas. “Tânia é uma profissional respeitada na Casa, benquista nos estados e muito dedicada ao cooperativismo. Era muito lógico, para mim, que ela assumisse essa posição. Não a escolhemos como superintendente para cumprir algum tipo de cota na instituição. Ela vinha de uma carreira muito  muito bem-sucedida: foi gerente; depois, gerente-geral, e agora é superintendente. É justo.”

A pergunta que fica agora é: que novidades Tânia ainda trará para o Sistema OCB? Se considerarmos a trajetória dela até aqui, o certo é que ainda virá muita inovação, competência e pioneirismo.

O que mais me chama atenção na Tânia é a competência dela, sem dúvida, mas, principalmente, a vontade de realizar as coisas. Ela é uma pessoa extremamente focada, que tem uma missão, um objetivo. Ela tem isso claro de que essa missão dela é desenvolver e fazer a diferença na vida das nossas cooperativas, e para isso, dedica todo o esforço, toda a atenção, e não deixa nada tirá-la desse curso. Ela é uma pessoa que gosta de inovação, e exige inovação constante da equipe dela. Nada pode ficar no mesmo lugar, do mesmo jeito, tem que estar sempre melhorando e criando”, elogia Fabíola.

Sucessora de Tânia no cargo de gerente-geral do Sistema OCB, Fabíola também destaca o cuidado com a equipe. “Ela gosta de conhecer as pessoas, entender quem está cuidando de cada projeto, e agradecer à pessoa pela dedicação, pelo compromisso. Mas ela exige, também, o mesmo compromisso e dedicação que ela tem. Afinal, ela quer garantir que a gente entregue os resultados que as cooperativas merecem e esperam da Unidade Nacional.”

Para finalizar a matéria, vale destacar que Tânia é uma dessas mulheres que podem se orgulhar de serem felizes na carreira e no amor.  No fim do ano passado, ela e Raul se casaram. O marido lhe deu também dois enteados, Ravi e Maria. 

Tania e o marido, Raul Monteiro

Tânia e Raul se conheceram durante o carnaval, mas de uma maneira diferente do habitual – não foi em um bloquinho ou em um baile, como se esperaria. “Nem eu e nem ela gostamos; estávamos fora do carnaval, mais em casa. Nós nos conhecemos fazendo compras. Sentíamos a necessidade de conhecer alguém que valesse a pena.”, conta Raul. 

Hoje, eles moram em uma casa em Brasília, onde Tânia — que passou mais da metade da vida em apartamentos — pode voltar a experimentar a sensação de espaço e liberdade que tinha na infância. Feliz e sentindo-se realizada, ela, aos poucos, vê a casa voltando a ficar cheia, nos finais de semana, como quando era criança. E durante a semana, segue conquistando seu espaço e fazendo muito pelo coop. E tem conquista melhor do que essa?


Esta matéria foi escrita por Devana Babu e está publicada na Edição 37 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Uma nova chance

Valdemar de Jesus, motorista da Cooperativa | Crédito: Marília Lima

O cooperativismo enxerga em quem já passou por muitas dificuldades na vida uma qualificação para a qual o mercado muitas vezes fecha os olhos, em uma espécie de cegueira que vai na contramão da empatia e da própria movimentação da economia e do trabalho. Enxergamos em cada uma dessas pessoas o desejo de se sentirem úteis e produtivas. Por isso, de norte a sul do país há exemplos de cooperativas que os contratam como colaboradores ou oferecem a eles uma opção de emprego e renda como cooperados. 

Um exemplo de como essas pessoas têm a vida transformada pelo cooperativismo pode ser visto no Distrito Federal. Valdemar de Jesus, 38 anos, o Dema, ingressou na cooperativa Sonho de Liberdade em outubro de 2021. Ele conseguiu uma vaga de ajudante de caminhão logo após deixar a Penitenciária da Papuda, após cumprir 18 anos de prisão — sendo o último deles no regime semiaberto, quando recebeu a liberdade condicional. Dema soube da existência da cooperativa quando ainda estava privado de liberdade e contou com um pedido da mãe para fazer parte do grupo. 

Se não fosse a cooperativa, eu poderia ter voltado ao mundo do crime. O desespero faz as pessoas cometerem besteira nessa vida. Graças a Deus, e ao trabalho que faço na cooperativa, estou com vida nova, podendo sustentar a família, comprar chinelo, me alimentar. Consegui até tirar minha identidade e CPF, pois eu não tinha nada”, conta.

Hoje, Dema diz ter tudo: uma casa simples, uma esposa, um objetivo na vida. “Esse projeto de reeducandos é maravilhoso, mudou a minha vida. Até o fim do ano, eu quero ter meu próprio carrinho, para trabalhar com reciclagem de lixo”, conta o homem que, na cooperativa, trabalha das 7h às 17h, de segunda a sexta-feira, descarregando material de obra de caminhões de construtoras. O material vai para a reciclagem e volta em formato de madeira para faixas, painéis e outros objetos. 

Crédito: Marília Lima

Pelo trabalho, Valdemar recebe café da manhã, almoço, lanche da tarde e R$ 70 por dia, no caso de descarregar dois caminhões. Se descarregar dois caminhões a mais por dia, ganha um acréscimo de R$ 40 — um pagamento que ele pode receber por semana, por quinzena ou por mês, de acordo com sua escolha.

“A cooperativa tem motorista de caminhão e de trator, tem operador de máquina, tem soldador. Eu sou ajudante de caminhão, carrego o caminhão com os restos de material de obra. Estou trabalhando no Setor Noroeste, onde tem muita obra, muito prédio sendo construído. Eu passo o dia limpando as obras. Mas estou aprendendo a fazer de tudo”, conta.

Com suas funções na cooperativa, ele confessa ter mudado de vida e diz que é, sim, um novo homem. “Esse lugar é muito importante para um egresso do sistema prisional. Aprendi a dar valor ao meu suor, ao meu dinheiro, à minha vida. Não uso mais droga, nem bebo”, garante o cooperado, que se tornou uma pessoa responsável, aprendeu a cumprir compromissos e a ter disciplina. “Tem gente que está na cooperativa desde o início. Pretendo ficar muito tempo. Eu me esforço e quero crescer. E quero transmitir essa experiência de vida para outros ex-detentos”, fala, emocionado.  

RECICLAGEM DE SONHOS

Crédito: Marília Lima

A cooperativa Sonho de Liberdade surgiu em 2007, quando um grupo de quatro detentos da Penitenciária da Papuda resolveu se unir em busca de um sonho: reconstruir a própria vida sem depender de ninguém. Eles trabalhavam no regime semiaberto, costurando bolas de futebol em um projeto chamado Pintando a Liberdade. O trabalho era muito bem feito, mas poucas pessoas queriam pagar R$ 30 por uma daquelas bolas, preferindo adquirir marcas famosas, por exemplo, por R$ 100. Insatisfeito com a situação, Fernando de Figueiredo, 49 anos, propôs ao grupo que eles mudassem o foco da produção, trabalhando com sobras de material de construção. 

Quando eu estava no regime semiaberto, fui morar perto de um lixão. Lá, percebi que muito resto de madeira era jogado fora, desperdiçado. A gente, então, pediu para os motoristas do caminhão deixarem o material na chácara de um amigo. Eu e mais três companheiros começamos a fazer reciclagem. Vimos que dava para aproveitar muita madeira e conseguir dinheiro com ela”, conta Fernando.

A cooperativa, que começou informalmente, com quatro pessoas, chegou a ter 100 integrantes. Hoje, conta com 40 membros. Metade é formada por ex-detentos e metade, por pessoas que estavam em situação de rua. “E não estão mais, graças a Deus”, diz Fernando. De acordo com ele, a média de salário dos cooperados gira entre R$ 2 mil e R$ 4 mil por mês. Os carpinteiros, cooperados que dominam as ferramentas, ganham mais; os carregadores de caminhão recebem salário um pouco menor.

Para ingressar na Sonho de Liberdade, o primeiro passo é comprovar o desejo de mudar de vida.

Crédito: Marília Lima

A gente não dá o peixe, mas dá a vara pro cabra pescar. Nosso objetivo é resgatar a vida do ex-detento não por meio do assistencialismo, mas do trabalho”, conta, enquanto ajuda a equipe a separar os diferentes tipos de madeira que servirão para a fabricação de painéis e de confecção de diversas tábuas para as obras. Madeira que iria para o lixo é transformada, dia a dia, em cavacos, madeira triturada, pallets

Muita gente encontrou na cooperativa uma chance de mudar de vida. São pessoas que estavam no mundo do crime, roubavam, traficavam e até matavam. Hoje, deixaram de cometer delitos e ocupam a mente com trabalho, com uma perspectiva de futuro. Um ajuda o outro; um cai, o outro apoia. A gente conversa quando eles têm recaída. Aqui não tem discriminação ou exclusão. A gente está lá para estender a mão, fazer com que a pessoa se sinta em casa. Eu me sinto o cara mais rico do mundo sem ter dinheiro na conta”, define. 


Esta matéria foi escrita por Freddy Charlson e está publicada na Edição 37 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Olhar maduro

Para muitas pessoas a cooperativa é a oportunidade de sustentar a família, além da conquista da casa própria – por meio de projetos habitacionais da cooperativa – e de estudos, também pelas parcerias com instituições educacionais. "Temos sócios com mais de 80 anos de idade que desempenham brilhantemente suas atividades e são gratos pelo trabalho, que lhes dá prazer de viver, em primeiro lugar”, afirma a presidente da Cooperativa de Trabalhadores Autônomos das Vilas de Porto Alegre (Cootravipa), Imanjara Marques de Paula.

Imanjara Marques de Paula, presidente da Cooperativa de Trabalhadores Autônomos das Vilas de Porto Alegre (Cootravipa)

Aos 69 anos,  Sandra Chaves é uma dessas cooperadas que não pretende deixar de trabalhar. Associada da Cootravipa desde 1991, ela foi supervisora da varrição durante 30 anos. Hoje, exerce a função de auxiliar de serviços gerais nos sanitários públicos do centro da capital gaúcha. Com o trabalho na cooperativa, criou os cinco filhos e construiu a casa própria.

A Cootravipa é tudo para mim, eu vivo pela Cootravipa. É uma porta aberta para quem precisa de ajuda e de traballho”, confessa.

A presidente da instituição, filha dos fundadores da cooperativa, orgulha-se de sempre ouvir depoimentos como esse.

Nossa missão é oportunizar acesso ao trabalho e proporcionar renda àqueles que não se enquadram no perfil do mercado, além dos idosos, muitos deles responsáveis pela renda familiar. Eles merecem mais do que nossa acolhida, merecem nosso respeito pela experiência e o muito que têm a nos ensinar”, elogia Imanjara.

Fundada em 15 de julho de 1984, a Cootravipa é oriunda do movimento comunitário da Zona Sul de Porto Alegre, mais precisamente da Grande Cruzeiro, onde, na década de 80, mais de 3 mil desempregados viviam com suas famílias à margem da sociedade, muitos deles sem trabalhar há mais de nove meses. A União de Vilas e comunidade decidiram montar acampamento na Praça da Matriz, para reivindicar junto aos governos municipal e estadual uma solução para o desemprego e miséria. A oferta foi de 200 vagas de trabalho pela Prefeitura. 

Animada com a possibilidade, a comunidade começou a discutir a proposta de abrir uma cooperativa. “Naquela época, eram necessárias 20 pessoas com capital suficiente para pagar a cota-capital, mas a maioria era desempregada. Foi organizada uma arrecadação para quem não tinha o valor necessário e cada um colaborou com o que podia”, conta Imanjara Marques de Paula. A Cootravipa iniciou com 23 fundadores: 18 homens e cinco mulheres. Atualmente, são 706 mulheres no quadro de sócios, de um total de cerca de 2.500 associados. 

DNA PARA INCLUSÃO 

O advogado Waldyr Colloca, 54 anos, especialista em direito cooperativo, considera as cooperativas importantes ferramentas de inclusão social e financeira, à disposição de qualquer pessoa ou grupo.

Elas são uma sociedade ferramental, um utensílio, não têm um fim em si mesmas, só têm sentido se estão nas mãos das pessoas. Qualquer pessoa ou grupo que se junta tem potencial para criar uma cooperativa”, afirma.

No atual cenário econômico — em que não há vagas para a grande massa que está procurando emprego, no auge da capacidade produtiva —, fica ainda mais difícil encontrar alternativas para quem está à margem da sociedade, seja porque são mais velhas, seja porque já foram ou estão presas. Nessa realidade, o cooperativismo faz sentido, por juntar o saber fazer com um projeto.

As cooperativas fazem muito sentido para idosos, ex-detentos e detentos, mas não são um modelo criado para eles; não têm essa intenção intrínseca, mas podem ser utilizadas para esse fim. Há vários projetos bacanas que se preocupam com a reintrodução das pessoas a partir dos 50 anos no mercado de trabalho. O mais legal seria formar não uma cooperativa só de idosos, mas com uma mistura de idades. Ambos os grupos têm muito a ensinar e a aprender em um mundo que descarta uma geração mais antiga e pega uma nova”, considera Waldyr Colloca.

Ainda segundo Colloca, quando se fala em cooperativismo para pessoas acima dos 50 anos, não faz muito sentido pensar em outro ramo que não o das cooperativas de trabalho. “Enquanto as demais cooperativas servem para incluir ou reincluir empreendedores de qualquer idade no mercado de negócios, as cooperativas do ramo de serviços são aquelas que, por natureza e vocação, se consubstanciam na mais preciosa e adequada ferramenta de reinserção dos profissionais excluídos no mercado de trabalho”, explica.

De fato, cooperativas são instrumentos de inclusão, jamais de isolamento. Por isso, elas deveriam abrir espaço para pessoas de todas as idades. “Me parece uma ideia bastante plausível e interessante que a ‘comunidade madura’ se reúna em torno de um projeto cooperativista; não há dúvida nenhuma de que faz mais sentido ainda que esse mesmo grupo, visando não só a integração entre gerações, como também — e sobretudo — a inversão dessa perversa lógica, segundo a qual uma geração precisa desaparecer para dar lugar à outra, aceite de braços abertos o ingresso de associados mais jovens”, finaliza o advogado.


Esta matéria foi escrita por Freddy Charlson e está publicada na Edição 37 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


De mãos dadas

Aureliana Rodrigues Luz

Atravessar o temporal de pé enxuto: essa é a meta que Aureliana Rodrigues Luz, 49 anos, se impõe quando está diante de dificuldades. Presidente da Unidade Estadual do Sistema OCB no Maranhão, ela traz da Assistência Social (sua área de formação) uma série de contribuições para tornar o cooperativismo uma via de emancipação para as mulheres. 

Nas andanças pelo estado, Aureliana se reúne com as cooperadas e as estimula a participar do dia a dia de suas organizações. As ações de promoção da equidade de gênero já surtiram efeito e fizeram com que a participação feminina alcançasse 30% no cooperativismo maranhense.

As mulheres foram galgando posições de liderança no cooperativismo, desenvolvendo áreas e funções que outrora eram exclusivamente ocupadas por homens. Mas sabemos que ainda existe significativa resistência e preconceitos contra a potencialidade feminina”, alerta a executiva, que foi a responsável pela criação de duas cooperativas: uma de pescadores e outra de marisqueiros. 

Em meio à pandemia, a presidente do Sistema OCB-Sescoop do Maranhão incentivou as cooperativas a investirem nos cursos a distância e a buscar caminhos de intercooperação.

Por incrível que pareça, nos aproximamos mais, fizemos mais parcerias e só assim atravessamos esse temporal de pé enxuto”, conta Aureliana. 

“Estamos agora mantendo nossas conexões com os parceiros, na certeza de que esses desafios serão vencidos e o cooperativismo continuará contribuindo para o desenvolvimento social, político e econômico.”


Esta matéria foi escrita por Juliana Nunes e está publicada na Edição 37 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Guardiã da semente

Micheli Bresolin

Uma das lideranças mais jovens do cooperativismo Agropecuário mora no Rio Grande do Sul e preside a Cooperativa Mista de Agricultores Familiares de Itati, Terra de Areia e Três Forquilhas (Coomafitt). Micheli Bresolin tem 32 anos e é formada em matemática. A família trabalha com o cultivo de banana há três gerações, produção que começou com os avós maternos.

Minha avó capinava de guinchado. Minha mãe nasceu e cresceu naquela propriedade. Casou-se e permaneceu ali. Eu saí pra estudar, mas já pensando em voltar”, conta Micheli. Hoje, a família trabalha com a produção de banana orgânica voltada, principalmente, para o mercado de alimentação escolar. A transição para um cultivo sem agrotóxico teve a ajuda da Coomafitt, cooperativa criada há 15 anos.

“Foi necessário adaptar a produção para o uso de roçadeira e biofertilizantes. Durante a transição, houve queda na produtividade, já que as bananeiras estavam acostumadas a crescer com a adubação química. Quando você tira isso, a produção decai, mas, com as técnicas adequadas, logo volta a subir”, explica a agricultora, que, além de cursar matemática, fez curso de manejo do açaí e gestão comercial. Em 2015, iniciou a carreira na Coomaffit. Primeiro, como funcionária; depois, como cooperada e diretora.

Micheli junto à família | Divulgação Coomafitt

Na presidência da cooperativa desde março de 2021, Micheli lidera 272 pequenos produtores, compartilhando com eles as experiências da própria família. No contato diário com os cooperados, mostra como o cooperativismo pode melhorar a vida dos agricultores, que deixam de depender de atravessadores para comercializar seus produtos. O objetivo é alcançar autonomia e garantir um preço justo pela produção. A diversificação dos cultivos e a parceria com as escolas também são caminhos defendidos por ela.

A presidente da Coomaffit reconhece que, nos últimos anos, houve um aumento da liderança feminina no cooperativismo e no agro. Antes, as cooperadas trabalhavam apenas em casa e na roça. Os homens assumiam a parte comercial. 

As mulheres não tinham sequer talão para emitir nota fiscal no nome delas. É um longo histórico de submissão. Temos atuado para mudar isso, por meio de rodas de conversa e formação”, conta. 

Outro eixo de trabalho de Micheli é a juventude. Ela quer garantir a permanência dos jovens no campo. Para isso, estabelece parcerias com a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) e a Redecoop — cooperativa de abastecimento de alimentos da agricultura familiar que fomenta a intercooperação no campo — para a realização de cursos e assistência técnica. Com o apoio da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), ofereceu até mesmo um curso sobre liderança de jovens e mulheres.

Durante a pandemia, um dos maiores desafios da presidente da Coomafitt foi manter as cooperativas motivadas. Com o fechamento das escolas, o escoamento da produção sofreu um grande impacto. A alternativa foi investir nas vendas on-line para os municípios do litoral gaúcho. A cooperativa chegou a entregar cerca de 100 cestas semanais.

Este ano, a estratégia de ampliação de vendas está focada no aumento da certificação da produção agroecológica e na adoção de ferramentas de rastreabilidade, que oferecem ao consumidor a possibilidade de checar por QR Code a procedência dos produtos dos cooperados — principalmente da banana orgânica. 

Estou tão focada no nosso trabalho que levei até um susto quando fui avisada do prêmio da Forbes. Nunca imaginei que pudesse causar um impacto tão grande. Os homens perguntam como conseguimos chegar lá. Parece até que não é pelo nosso esforço”, reclama Micheli, que hoje se vê como uma mulher representando outras.

“A mulher na história sempre foi importante para a agricultura familiar. A mulher é a guardiã da semente. Estamos desafiando a lógica do machismo. A mulher é capaz de produzir, coordenar e mostrar para tantas mulheres que elas podem se desafiar, e que vai dar certo.”


Esta matéria foi escrita por Juliana Nunes e está publicada na Edição 37 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


Mulher atual

A história de Débora Cristiane Noordegraaf, 50 anos, com o agro e o cooperativismo começou há quase três décadas, no Paraná. O interesse do marido pela suinocultura envolveu toda a família e levou o casal para o cooperativismo. A Castrolanda Cooperativa Agroindustrial ajudou a transformar os sonhos dos Noordegraaf em realidade.

Fiz um curso na cooperativa, que se chamava Mulher Atual e era voltado para autoconhecimento, bem-estar e saúde. Estávamos em um grupo de seis mulheres e ficamos tão maravilhadas com esse curso que resolvemos mostrar nosso interesse em realizar mais cursos”, lembra a hoje coordenadora da Comissão Mulher Cooperativista da Castrolanda. 

Débora Cristiane Noordegraaf

Depois da primeira formação, Débora seguiu em busca de mais capacitação para ela e para outras mulheres, tanto na área técnica do agronegócio como na parte de liderança, oratória e posicionamento gerencial. A Comissão da Mulher, criada há 12 anos, passou a organizar iniciativas de difusão dos princípios do cooperativismo nas escolas de ensino fundamental e médio, o que tornou a Castrolanda pioneira na implementação das cooperativas escolares. Essas ações contribuíram para que as mulheres cooperadas hoje sejam 30% do quadro social da cooperativa.

Vemos que as mulheres estão mais atuantes, buscando conhecimento, se capacitando. Quando você começa a entender o que é a cooperativa e como ela funciona, a tendência é querer se capacitar mais, e isso só traz benefícios para nós, mulheres, e para a Castrolanda”, avalia Débora.

De olho na sustentabilidade da cooperativa, a coordenadora da Comissão da Mulher sonha trazer mais cooperadas e formar novas lideranças femininas dentro da Castrolanda.

Fico muito feliz e grata pelo reconhecimento a nível nacional, isso nos incentiva a seguir com nossas ações.”


Esta matéria foi escrita por Juliana Nunes e está publicada na Edição 37 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação