Shereen Zorba ressalta importância do coop para a sustentabilidade
- Artigo Secundário 2
Em entrevista, ela destacou como cooperativas podem impulsionar soluções ambientais
Shereen Zorba é secretária executiva do Fórum ONU Ciência-Política-Empresas para o Meio Ambiente (UN-SPBF) e chefe da interface entre Ciência, Política e Negócios no Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). Com mais de duas décadas de experiência nas organização internacional, ela lidera esforços globais para promover a sustentabilidade por meio da integração de ciência, política e setor privado.
Shereen também atua em áreas como proteção ambiental, tecnologia e Big Data, sendo uma das principais figuras na formulação de estratégias globais de dados ambientais do PNUMA. Sob sua liderança, o Fórum SPBF tem trabalhado para engajar diversas partes interessadas na criação de soluções ambientais sustentáveis que envolvem inovação tecnológica e cooperação entre setores.
Convidada para a Jornada Cooperativa rumo à COP29, organizada pelo Sistema OCB, Shereen concedeu uma entrevista exclusiva, em que compartilhou sua visão sobre o papel das cooperativas no enfrentamento das crises planetárias e como elas podem se posicionar de forma mais proeminente nas discussões globais sobre sustentabilidade. Entre outros tópicos, ela destacou a importância da inovação e da inclusão tecnológica para as cooperativas, especialmente em regiões vulneráveis, e o papel fundamental que essas organizações desempenham na construção de um futuro resiliente e sustentável.
Para ela, as cooperativas são fundamentais no enfrentamento aos desafios globais, e a COP30, a ser realizada no Brasil em 2025, será uma oportunidade de fortalecer o papel dessas entidades na promoção de um desenvolvimento ambientalmente responsável. Confira a entrevista!
- Qual é sua perspectiva sobre o modelo de negócios cooperativo?
O modelo de negócios cooperativo é mais relevante do que nunca. Com seu longo histórico, já está comprovado que ele funciona. Trata-se de um modelo bastante específico e importante, que confere poder aquisitivo aos produtores e impulsiona grandes movimentos em direção ao progresso, com garantia de participação social. Seja para mulheres, fazendeiros, operários ou grupos vulneráveis que necessitam de atenção, o modelo oferece espaço, voz e formas alternativas de cooperação. Sinto que, agora, mais do que nunca, diante dos desafios globais, como as mudanças climáticas, poluição e crises ecológicas, é essencial que esse modelo se fortaleça. Com o aumento das tensões geopolíticas, bem como as oportunidades e desafios trazidos pelos avanços tecnológicos, especialmente a inteligência artificial e outras tecnologias digitais, acredito que desenvolver capacidade, presença e resiliência entre as cooperativas pode proporcionar ao mundo, e às pessoas, uma oportunidade única de progresso.
- Pode contar um pouco sobre o Fórum Ciência-Política-Empresas da ONU, sobre o meio ambiente e como se relaciona com as cooperativas por todo o mundo?
O Fórum foi criado em 2017 e concebido desde o início para atuar em todo o sistema das Nações Unidas. É uma plataforma construída com base na ideia de inclusão, conforme solicitado pelos estados-membros, visando especialmente a interação com cooperativas. O principal objetivo do Fórum é criar um espaço para interações diretas, reais e autênticas entre o setor privado e as políticas governamentais, fundamentadas tanto na inclusão social quanto na ciência. Ele orienta como devemos agir, além de abarcar a pesquisa e o desenvolvimento, economia, ciências digitais e inteligências artificiais — ferramentas e inovações científicas essenciais para alcançarmos metas ambientais complexas, mas cruciais. No que tange às cooperativas, tenho o orgulho de afirmar que nossa parceria com elas, especialmente as brasileiras, será um dos grandes marcos para transformar a perspectiva global e impulsionar o papel das cooperativas através da COP30. Já iniciamos esse processo e acredito que será um avanço significativo. Como mencionei anteriormente, não se trata apenas de promover interações, mas de assegurar a inclusão de forma ampla e eficaz. Isso é fantástico, especialmente considerando que a COP30 ocorrerá no Brasil, o que torna esse trabalho de interação ainda mais relevante no momento.
- Quais são os desafios globais mais significativos que enfrentamos no que diz respeito ao meio ambiente e à sustentabilidade?
Acredito que o Programa das Nações Unidas para o Ambiente e a ONU abordam essa questão como uma das três grandes crises planetárias. Fica claro que estamos lidando com um quadro de poluição, crises climáticas e na natureza, especialmente no que diz respeito à ecologia, biodiversidade e ecossistemas. O ponto é que elas estão interligadas. Não podemos isolar uma delas e, por exemplo, tratar das mudanças climáticas sem considerar a natureza, ou lidar com a natureza sem levar em conta a poluição. Quando olhamos por diferentes perspectivas, especialmente em relação às Conferências das Partes (COPs), é importante destacar que, entre todas as COPs em andamento, a do clima é uma das mais famosas e impactantes. Isso nos dá uma clara noção da importância de aproximar todos esses setores e, ao mesmo tempo, nos faz questionar se estamos realmente no caminho certo.
Nossa expectativa para a COP30 é mostrar que esse espaço é destinado ao trabalho e à iniciativa, onde responsabilizamos a nós mesmos e ao mundo. É um espaço em que relatamos nosso desempenho enquanto setores da sociedade, seja no governo, nas diversas indústrias, no setor privado ou no cooperativismo em relação às metas de sustentabilidade estabelecidas. Isso vale em âmbito global, nacional, local e regional. Acredito que uma parte essencial desse processo seja integrar os relatórios de metas ambientais e climáticas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). As Nações Unidas estão trabalhando para mapear essas metas através do que chamamos de Acordos Multilaterais Ambientais. Há diversos indicadores científicos, além de 24 ou 25 indicadores que abrangem o quadro geral dos ODS.
Acredito que estamos vivendo um momento em que, antes de mais nada, precisamos nos responsabilizar pelos resultados alcançados, em vez de apenas divulgar grandes mensagens. Precisamos assumir responsabilidade por nosso papel e resultados. Além disso, é uma excelente oportunidade para mobilizar pessoas e recursos para abrir portas ao cooperativismo. Todos com quem converso sentem que, com o Brasil sediando a COP30, temos uma grande oportunidade de fazer melhor se estivermos realmente dispostos a nos unir. Isso é algo extraordinário. O que mais precisamos agora é responsabilidade e iniciativa.
- Por todo o mundo, como o papel e a performance das cooperativas respondem aos desafios ambientais? Há como as cooperativas crescerem com desenvolvimento sustentável e proteção ambiental em mente?
Acho que uma coisa que, definitivamente, podemos concordar é que o papel das cooperativas, assim como o modelo coop, está diretamente ligado à performance ambiental. Vimos exemplos claros de como as cooperativas lidam com os desafios ambientais e a razão para isso é simples: quando se representa comunidades, especialmente as mais vulneráveis, como na Amazônia, pequenos fazendeiros e outros, essas comunidades são as mais impactadas, e de forma mais direta, pela deterioração do meio ambiente. Elas estão na linha de frente quando se trata de eficiência no uso de recursos e na busca pela sustentabilidade. Nesse sentido, fica claro que essas comunidades precisam que o meio ambiente seja sustentável e resiliente diante dos desafios ambientais, já que elas são as mais atingidas. Ao mesmo tempo, para alcançarmos os melhores resultados possíveis com o engajamento das diversas cooperativas existentes, precisamos de resiliência e de um movimento de cooperação cada vez mais fortalecido. Isso inclui a cooperação entre países de renda média e baixa. Globalmente, o empoderamento das cooperativas por meio da tecnologia, da resiliência financeira, de garantias, de avanços tecnológicos e do acesso a essas inovações, certamente capacitaria as cooperativas a desempenharem o papel que esperamos delas. Além disso, é animador ver o Brasil na liderança desse movimento. Ver o cooperativismo alcançar esse estágio, estabelecendo contatos e criando oportunidades, nos dá a confiança de que um trabalho excelente está sendo feito na prática e que trará resultados e dividendos no futuro.
- Em 2023, o Sistema da OCB realizou um diagnóstico entre 365 cooperativas pelo país, revelando uma pontuação média de 51% de aderência ao modelo ESG. Como você enxerga a performance das cooperativas brasileiras e como elas podem se desenvolver mais?
Vejo que as cooperativas brasileiras trabalham com muita seriedade. Evidentemente, ao analisarmos as estatísticas e ao expor, com transparência, o que está indo bem e o que não está, percebemos que essa é a atitude correta a ser adotada. Considero uma verdadeira inspiração para outras cooperativas. No entanto, é claro que sempre há espaço para melhorias e, para isso, muitas questões precisam ser estabelecidas. Já discutimos sobre como construir capacidade e garantir que exista uma estratégia clara. O processo realmente começa com números e análises. Agora, talvez seja o momento de aprofundarmos um pouco mais para entender quais setores estão prosperando, como os sistemas alimentares ou a agricultura, e quais não estão, identificando as razões por trás disso.
Compreender as causas é de extrema importância, e pode ser que a solução exija intervenções e apoio governamentais, regulamentações de comércio e legislações internacionais, regionais ou nacionais. O comércio é crucial para fortalecer o movimento cooperativista, pois a troca justa é essencial para empoderar as comunidades que produzem e executam o trabalho. Portanto, existem uma série de fatores complexos que precisam ser considerados. A primeira medida é ter como base a ciência, algo que já está em andamento, e estarmos dispostos a realizar uma análise adequada. Além disso, é necessário que possamos nos manifestar para gerar e incentivar o apoio de diferentes comunidades, governos, da indústria e do setor privado, para que eles compreendam melhor o papel vital que as cooperativas desempenham e como potencializar seu avanço. Por fim, um dos aspectos mais importantes é o próprio movimento cooperativista assumir a liderança, tomando a iniciativa de melhorar e estar disposto a encarar os fatos.
- Qual é o papel da inovação no desenvolvimento sustentável e como isso se aplica às cooperativas em diferentes setores?
Seja na cultura, no espaço de trabalho ou em outros contextos, a inovação é extremamente importante em nossa vida de forma geral. Acredito que vivemos em um mundo onde a inovação transformou completamente nossas vidas em menos de uma geração. Não pretendo falar sobre a minha idade, mas cresci sem a internet. Não tínhamos iPhone e veja onde estamos agora. Considero que as oportunidades, especialmente quando falamos de inovação tecnológica, estão ligadas ao acesso e à inclusão, principalmente em relação aos países em desenvolvimento e às comunidades vulneráveis. Precisamos estar conscientes de que, para o mundo alcançar suas metas, todos precisam ser empoderados. O acesso à tecnologia, a construção de capacidade e o financiamento de inovações são questões fundamentais que precisamos abordar. Também é crucial reconhecer que, embora inovações em tecnologias digitais e inteligência artificial sejam evidentemente importantes, a inclusão tecnológica é igualmente relevante. Além disso, é necessário reconhecer que a inovação também ocorre no nível comunitário, particularmente em soluções relacionadas à natureza e que buscam a sustentabilidade. Podemos sempre observar as sociedades que estão na vanguarda do trabalho comunitário, onde a natureza tem um papel essencial, e perceber como a sabedoria tradicional contribui para a construção de resiliência.
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