Ninguém fica de fora
Aos vinte e poucos anos, Carlos Alberto de Oliveira quase desistiu de sua terra-natal. Apesar do amor pela Paraíba, pensava em mudar-se para o Rio de Janeiro ou São Paulo em busca de oportunidades de trabalho. Carlos Alberto é deficiente físico. Nasceu sem um segmento de um dos braços, que termina no cotovelo – e essa característica acabava por fechar portas no mercado de trabalho. Sua sorte, no entanto, começou a mudar quando conseguiu o primeiro emprego como porteiro. Três anos depois, mais consciente de que a deficiência não lhe limitava profissionalmente, juntou-se à Cooperativa Paraibana dos Portadores de Deficiência (Coppd), em Campina Grande. Desde então, trabalha organizando o estacionamento rotativo da cidade, a chamada Zona Azul.
“Gosto demais de trabalhar aqui porque estou em contato com o público, atendendo. A maioria das pessoas da cidade já me conhece, pergunta pelas vagas e até deixa a chave do carro comigo porque passamos confiança”, conta, sorridente.
A história de Carlos Alberto é uma em meio a diversas iniciativas cooperativistas de inclusão social espalhadas pelo país. Algumas, como a Coppd, são cooperativas voltadas especialmente para a colocação de deficientes no mercado de trabalho. Outras cuidam de outras minorias, como mulheres, dependentes químicos ou, no caso da Coopereso de Sorocaba (SP), presidiários. Existem, ainda, as cooperativas como a Unimed Londrina, que buscam ativamente inserir deficientes em seu quadro de colaboradores.
Tais iniciativas são importantes para aumentar a representatividade de grupos que têm dificuldade para se inserirem no mercado de trabalho brasileiro. No caso das pessoas com algum tipo de deficiência, apenas 1% (cerca de 403 mil) estão formalmente empregadas, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Um número inexpressivo, considerando a Lei de Cotas (8.213/91), que determina: pelo menos 2% dos colaboradores de empresas com mais de cem funcionários devem ser pessoas com deficiência. Este número está longe de ser realidade.
Essa inclusão cooperativista, portanto, cumpre um importante papel social. E ainda gera cooperação interna nas empresas, educação, aperfeiçoamento constante e interesse pela comunidade. Conheça a seguir a história de três cooperativas que já descobriram o poder da inclusão e como seus benefícios atingem não apenas os grupos marginalizados, mas toda a comunidade ao seu redor.
ABRINDO PORTAS
Na Coppd de Carlos Alberto, os cooperados atuam na área de estacionamento tarifado pelo município, conhecida como Zona Azul, por meio de um convênio com a prefeitura. Atualmente, são 19 deficientes físicos trabalhando no local. A parceria existe há 20 anos, mas era celebrada por meio de uma ONG. Em 2009, uma mudança na legislação exigiu a descontinuidade do contrato e foi então que os trabalhadores se organizaram em uma cooperativa para seguirem exercendo sua atividade.
Para muitos deles, a Coppd apresentou a oportunidade do primeiro emprego. Foi assim com Gisele Rodrigues, cooperada há um ano e meio.
Tenho deficiência em uma das pernas, encurtada e mais fina, por isso manco um pouco. Tentei arrumar trabalho em várias empresas e nunca consegui. Aqui eu gosto de trabalhar porque é tranquilo e os clientes nos tratam bem”, diz.
Segundo o presidente Jean Araújo Gomes, a cooperativa oferece uma alternativa mais estável aos cooperados do que empresas comuns. “Há mais de três anos que a fiscalização [da Lei de Cotas] parou de acontecer por aqui e as empresas tradicionais aumentaram as demissões de deficientes. Como cooperativa, damos estabilidade e continuidade”, conta.
A segurança de emprego e a possibilidade de crescimento também são pontos destacados por Carlos Alberto:
O modelo de cooperativa é bom porque é estável. Como todo mundo é dono, cada um dá o seu melhor para a cooperativa crescer e abrir portas para mais pessoas”, afirma.
Essas portas são abertas inclusive para não cooperados. A Coppd encaminha interessados para vagas em outras empresas, como empresas de ônibus, hospitais e indústrias. “Há pouca procura, mas dos pedidos de empresas que já recebemos, 99% conseguimos encaminhar”, conta Jean.
Além de colaborar com a inclusão, a Coppd tem um projeto de doação de equipamentos ortopédicos, como cadeira de rodas, de banho e muletas a pessoas necessitadas. Uma iniciativa apresentada à sociedade, inclusive, no Dia C . Dessa forma, eles estendem os benefícios da cooperativa à toda a comunidade e não somente aos cooperados.
O presidente destaca que para realizarem tantas atividades, o suporte do Sistema OCB/PB é fundamental.
Aqui no Nordeste não se trabalha tanto em cooperativas, não se conhece o cooperativismo a fundo. Então o apoio deles é essencial. Sempre que precisamos de informação, eles vêm, oferecem cursos e nos ajudam”, afirma o presidente.
Esta matéria foi escrita por Naiara Leão e está publicada na Edição 25 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação