Dados compartilhados

Só existe uma maneira de se manter competitivo nesse mar de dados que as novas tecnologias da informação disponibilizam diariamente: saber usá-los de forma estratégica e segura. No cooperativismo, o Ramo Crédito é um dos mais ativos e experientes nesse sentido, até devido à necessidade de garantir a segurança dos dados dos cooperados e, ao mesmo tempo, fazer a análise e a classificação de riscos dos produtos e serviços. 

Os diferentes sistemas desenvolvem, com primazia, seus próprios bancos de dados, plataformas de autoatendimento, soluções de pagamento e classificação de risco. Mas como segurança nunca é demais, eles ainda contam com o apoio de uma entidade suprassistêmica, de caráter intercooperativo: o Fundo Garantidor do Cooperativismo de Crédito (FGCoop) que, dentre outras atribuições, analisa —  com sigilo e imparcialidade — os dados financeiros de 648 singulares captadoras de depósito. Objetivo? Identificar, com antecedência, o risco de uma cooperativa fechar as portas. Assim, é possível atuar preventivamente para evitar que a cooperativa entre em liquidação, ou seja, precise encerrar as atividades por insolvência. 

Uma das maneiras de fazer isso é apoiando — sob demanda dos Sistemas — a incorporação dessas singulares por outras maiores e financeiramente mais sólidas.  Nos últimos três anos, o FGCoop realizou oito operações de assistência financeira para viabilizar essas incorporações. Elas beneficiaram diretamente 60,4 mil cooperados, que mantiveram sua confiança no cooperativismo financeiro intacta graças, também, a essa atuação preventiva do Fundo. 

INTELIGÊNCIA DE MERCADO

Em janeiro de 2023, o FGCoop lançará um segundo projeto com dados para apoiar as 648 cooperativas captadoras de depósito associadas ao Fundo. Trata-se de um painel de inteligência de mercado (business inteligence) que analisará a performance dessas cooperativas tendo como referencial o próprio universo do cooperativismo.

É um modelo que captura as informações, transforma em indicadores e compara, sempre entre cooperativas do mesmo tamanho”, diz o diretor-executivo do FGCoop, Adriano Ricci. “Temos o  modelo de análise de risco desde 2015, mas, nele, a cooperativa não sabe necessariamente como está o mercado. Nesse outro, ela conseguirá saber a sua situação em relação aos pares. Trata-se, portanto, de uma ferramenta de benchmarking (análise de mercado)”, observa Ricci. 

Adriano Ricci,diretor-executivo do FGCoop,

O novo painel de mercado do Fundo será disponibilizado gratuitamente às cooperativas associadas e deve beneficiar, principalmente, as singulares independentes e de menor porte, que não contam com a mesma estrutura de análise de dados dos sistemas e das centrais de crédito cooperativo. 

“Nosso objetivo é municiar as associadas de mais informações para que elas possam inserir, no seu planejamento estratégico, ações que ajudem a melhorar seus indicadores de desempenho”, acrescenta. 

CONSOLIDAÇÃO

As cooperativas financeiras passam, atualmente, por um momento de consolidação, em que estão fortalecendo sua estrutura de capital. De acordo com Adriano Ricci, do FGCoop, a maioria delas hoje trabalha com dados não apenas com o objetivo de monitorar riscos, o que é inerente à atividade financeira, mas também a fim de melhorar seu desempenho.  

Em todas as cooperativas, ao longo dos últimos anos, melhorou muito o aspecto da governança, compliance, controle e gestão. Boa parte desse processo é feito independente do FGCoop. Em alguns lugares, a central [cooperativa] faz esse trabalho, em outros, a própria cooperativa tem uma unidade [de análise de dados]. Pelo nível em que vejo as cooperativas hoje, [o uso de dados] não é uma coisa recente”, comenta. 

Para Ricci, um dos principais desafios do cooperativismo financeiro, agora, é reforçar a estrutura de capital conquistada e investir na comunicação. “Há dois anos, as cooperativas crescem mais do que os bancos percentualmente, em volume de depósitos, crédito. O principal desafio é continuar crescendo e ser conhecido. Um ponto fundamental é comunicar melhor à sociedade os benefícios de fazer parte de um sistema como esse. Investir em estrutura de capital e em reforço dos indicadores”, avalia. 

Ainda segundo o executivo, um ponto positivo em relação à expansão das cooperativas de crédito é que, mesmo com a maior quantidade de agências físicas, elas não deixaram de ampliar a presença digital. “As cooperativas estão crescendo muito fisicamente, na contramão dos bancos, mas não deixam de crescer no digital. O app ou a internet da cooperativa não deixa  a dever para nenhum banco”, comemora. 

OPEN FINANCE

Quando se fala em análise de dados no setor bancário, um dos primeiros conceitos que vem à mente é o de open finance, ou sistema financeiro aberto. Trata-se de uma iniciativa do Banco Central para padronizar o acesso às informações dos clientes, ou seja, permitir que eles possam acessar as informações que possuem em uma instituição a partir de outra. 

Segundo Márcio Alexandre, superintendente de Governança de TI e segurança cibernética do Sicoob e representante da OCB no Conselho Deliberativo do Open Finance, a iniciativa acompanha uma tendência mundial de compartilhamento de dados, mas com um escopo mais amplo, ao incluir informações sobre seguros, investimentos e previdência, por exemplo. Por isso, o Banco Central decidiu recentemente alterar o nome do projeto para open finance, por se tratar de uma iniciativa que excede os limites dos produtos bancários.

Ele pontua ainda que a iniciativa brasileira já se posiciona como a maior iniciativa de open finance do mundo e já conta com a participação do cooperativismo.

Marcio Alexandre, superintendente de Governança de TI e segurança
cibernética do Sicoob e representante da OCB no Conselho Deliberativo do Open Finance

A regulação não exige a participação obrigatória das cooperativas financeiras no open finance. No entanto, das mais de 800 instituições financeiras participantes, de forma voluntária ou obrigatória, a grande maioria são cooperativas financeiras”, diz. 

O objetivo do open finance é estimular a inovação e a concorrência no sistema financeiro. “Antes da implementação desse projeto, um cidadão que procurava uma nova instituição financeira tinha dificuldade em receber uma oferta assertiva à sua necessidade porque esta instituição tinha pouca informação sobre ele. E, dessa forma, as ofertas poderiam não ser competitivas quando comparadas às das instituições com as quais ele possuía relacionamento”, explica Márcio Alexandre. 

De acordo com ele, com a chegada do open finance, ao buscar uma nova instituição financeira, o cliente pode autorizar o compartilhamento de dados como seu histórico de transações em conta corrente ou cartão de crédito por um tempo determinado, a fim de que a instituição para a qual está migrando possa conhecê-lo melhor e ofertar um produto em condições de igualdade com os que possuía na instituição anterior. 

Nas cooperativas, as primeiras iniciativas construídas sob essa estrutura incluem, por exemplo, soluções disponibilizadas em agências que permitem à cooperativa, quando autorizado expressamente por cada cooperado, conhecer e comparar os produtos e serviços utilizados por ele e identificar oportunidades para ofertar produtos mais adequados.

Outras iniciativas são a associação digital inteligente, que permite à cooperativa aproveitar informações cadastrais do cooperado em outras instituições no momento de sua associação à cooperativa; o agregador de contas, que permite ao cooperado ter a visão completa de sua vida financeira em todas as instituições onde possui relacionamento no seu aplicativo da cooperativa; e a iniciação de pagamento, onde um cooperado pode comandar uma transação de Pix em outra instituição à partir da conta que possui na cooperativa.


Esta matéria foi escrita por Mariana Branco e está publicada na Edição 40 da revista Saber Cooperar. Baixe aqui a íntegra da publicação


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