Evaldo Matos faz balanço de ações e análise de cenário para o Ramo Transporte
Em entrevista especial sobre o segmento de transportes, o coordenador nacional do ramo Sistema OCB e presidente da Confederação Nacional das Cooperativas de Transporte (CNTCoop), Evaldo Matos, fez um apanhando sobre os gargalos e soluções que vêm sendo debatidos com órgãos, agências e entidades representativas.
Redução de acidentes
Sistema OCB: Sobre a atuação do cooperativismo para a redução de acidentes nas estradas, o presidente explicou que estão sendo realizadas uma série de eventos e que novas tecnologias estão sendo adotadas.
Evaldo Matos: Durante todo o ano as cooperativas de transporte realizam e participam de parcerias, programas e ações educativas com o objetivo de contribuir para conscientização do motorista para um trânsito seguro. Fomentamos campanhas contra ingestão de álcool ou drogas antes de dirigir e contra o uso do celular ao volante. Estes são graves fatores de risco, pois reduzem as capacidades motoras do motorista, tornando-o mais suscetível a cometer acidentes.
Nesse contexto, a tecnologia se torna uma grande aliada para aumentar a segurança e contribuir com a cultura da segurança nas rodovias. Temos investido em sistemas de monitoramento via GPS/GPRS, que permitem localização com precisão em casos de riscos, sensores de fadiga embarcado para acompanhar o condutor durante toda sua viagem, responsáveis em detectar sono e distração, uso de celular e cigarro ao volante, além de perceber a aproximação de risco e colisão. O sistema identifica os motoristas por reconhecimento facial e dispara alarmes sonoros em tempo real.
Pontos de Parada e Descanso
OCB: A infraestrutura e prestação de serviços para o efetivo descanso do caminhoneiro durante a viagem também foi tema abordado nas reflexões de Evaldo Matos. De acordo com ele, os Pontos de Parada e Descanso (PPD’s) têm sido essenciais para os profissionais e, no entanto, podem ser aprimorados por meio intercooperação e parcerias.
EM: Somos quase mil cooperativas de transporte estrategicamente posicionadas em diversos lugares do Brasil. Essa capilaridade proporciona possibilidades diversas para contribuir com esse apoio logístico necessário para os transportadores brasileiros na execução do seu trabalho. A possibilidade de intercooperação entre as cooperativas de transporte é outro fator. Muitas coops já possuem toda essa infraestrutura necessária como: postos de combustíveis, estrutura de alojamentos, restaurantes e casas de peças e oficinas para manutenção.
Entretanto, sabemos que a implantação de PPD é de livre iniciativa do interessado. Deste modo a implantação precisa trazer benefícios não só para os profissionais, mas também para os estabelecimentos e à sociedade como: a diminuição dos acidentes por falhas humanas devido ao cansaço; a redução de roubos e furtos; o desestímulo às práticas de prostituição e uso de drogas; e o estímulo à modernização dos estabelecimentos.
Podemos facilmente firmar, sem barreiras, parcerias com o motorista autônomo ou de empresas de transporte de pequeno porte. É fundamental evoluir nos entendimentos políticos, na sensibilização de entidades integradoras e facilitadoras desse processo tais como singulares, federações, confederações de cooperativas de transporte, embarcadores das cooperativas do Ramo Agro, as cooperativas de crédito, Governo e demais fornecedores.
Estes gargalos do setor de transportes não são problemas apenas do transportador, mas de toda a sociedade. A eficiência logística afeta diretamente a vida das pessoas. Pensar na melhoria das condições de trabalho destes profissionais, como recomendam as leis 12.619/12 (Regulamentação da profissão de motorista) e 13.103/15 (Lei do Descanso), é uma obrigação de todos.
Participação feminina
OCB: O quadro social das cooperativas de transportes ainda é majoritariamente masculino, Evaldo Matos contextualizou caminhos para aumentar a participação das mulheres no ramo.
EM: A inserção de mulheres e jovens é um tema recorrente no sistema cooperativo com um todo. Faz parte do nosso compromisso com as metas da ONU na busca pelo empoderamento feminino e novas oportunidades de trabalho. Dentro do Ramo Transporte, temos fortalecido esse coro com palestras de sensibilização, encontros e eventos para estimular a participação deste público.
O perfil do transportador é predominantemente masculino, até por conta das características da profissão. No entanto, com o advento do e-commerce desponta-se uma grande oportunidade para as mulheres com os perfis de carros leves. Para se ter uma ideia, o Brasil é o terceiro país que mais faz compras pela internet liderando o ranking de comércio eletrônico na América Latina. Nossa participação nas compras online corresponde a 59,1%, enquanto o segundo colocado, o México, representa 14,2% do montante.
Estamos falando de cerca de 80 milhões de brasileiros consumidores de e-commerce. A crescente demanda também tem aumentado significativamente a participação de mulheres e jovens nesse seguimento do transporte. Com maior número de cooperadas, mais potencial para que elas assumam cargos de governança.
Parcerias
OCB: As parcerias com entidades e, sobretudo, com o órgão regulador têm trazido importantes avanços, segundo o presidente Matos.
EM: A cada dia mais essa aproximação com a ANTT [Agência Nacional de Transportes Terrestres] vem gerando frutos importantes e significativos para o transporte. Entre várias ações conjuntas, podemos citar a participação no Fórum do Transportador, que reuniu diversos players de representação do transporte.
No último mês recebemos representantes da ANTT para apresentar de forma mais detalhada o cooperativismo brasileiro com o nosso Portas Abertas Sistema OCB. Firmamos ainda o termo de cooperação técnica para construção de um fluxo operacional para viabilizar o e-commerce, incluindo a visita de servidores da agência em cooperativas do ramo. Estas informações vão contribuir com ajustes na regulamentação de veículos leves que atuam no mercado eletrônico, trazendo maior segurança para esses transportadores e embarcadores.
Gargalos
OCB: Evaldo evidenciou os gargalos enfrentados pelo setor e frisou que isto influencia diretamente na vida de toda a população.
EM: Sem transporte não tem alimento na mesa dos brasileiros. Repito, o problema do transporte não é só do transportador, é um desafio social. O cenário precisa de mais atenção também quando nos referimos a escassez de mão de obra especializada no transporte. Motoristas estão deixando a profissão em busca de melhores condições de vida. A sucessão no transporte é outro desafio.
O Brasil tem crescido dia a dia em produção e o agronegócio tem mantido seu lugar de destaque como celeiro do mundo. Para 2023 há previsão de crescimento de 12% da safra. A estimativa é a de que a produção será de 300 milhões de toneladas. Para a sustentabilidade e êxito nessa empreitada, é necessário pensar que o transporte é elo inseparável e imprescindível dessa cadeia de produção de ponta a ponta.
A situação se agrava quando pensamos que não temos hidrovias ou ferrovias capazes de escoar nossa produção. Pesquisas apontam o transporte como o maior gargalo da indústria e o Brasil é refém das estradas. Atualmente mais de 70% do transporte passa pelas rodovias, pelos caminhões.
Em 2022, o transporte sofreu transformações muito significativas. Estradas deficientes e, muitas vezes, sem condições de tráfego, fretes considerados altos nominalmente, mas que não remuneram a atividade devidos aos altos custos de insumos. O destaque foram os aumentos absurdos que tivemos no diesel, além das altas taxas de juros.
Investimentos
OCB: Após criticar a qualidade das rodovias, o presidente da CNTCoop reforçou que o imbróglio do setor está na falta de investimentos efetivos. Segundo ele, as inovações devem partir da esfera privada.
EM: O Brasil não tem políticas públicas que sejam capazes de apontar para um futuro promissor para o setor. Em discurso o novo ministro do transporte Renan Filho prometeu investir R$ 20 bilhões em infraestrutura. Segundo ele o orçamento será três vezes maior do que o do governo anterior. Estamos na expectativa, torcendo para dar certo e que seja breve antes de a vaca ir para o brejo. A curto prazo acredito que a solução partirá da iniciativa privada e o cooperativismo pode ser ator-chave neste momento.
Somos capazes de construir inteligência logística baseada na cooperação para transporte do campo até as mesas dos consumidores. Com isso, não teremos impasses para exportar nossos produtos, manter celeiros cheios e estradas vazias. A produção sem escoamento não será uma preocupação. O transporte é a mola move a nossa economia e a cooperação é a esperança. Para isso, temos debatido inovações e conversado com os parlamentares sobre nossas dores e anseios.
Com a intercooperação poderemos avançar em questões como na redução do custo de quilômetro vazio, no compartilhamento de cargas, na capacitação da mão de obra, na alocação mais eficiente de recursos utilizando tecnologias, em estratégias de crédito e, em especial, na eliminação de atravessadores.